terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Um Conto de Réveillon

Naquela noite Alberto Allein havia sido liberado mais cedo de seu trabalho. Devido a sua grande eficiência, seu patrão acabava lhe dando varias regalias, e uma delas era essa. Em plena véspera de ano novo, Allein chegou bem mais cedo em seu apartamento, muito antes do que gostaria.

A questão é que o jovem rapaz não gostava de nenhuma comemoração, não por causa de crenças ou gostos particulares, mas por não ter com quem comemorar. Em datas festivas a sua solidão acabava tomando formas grotescas, de tal jeito que ele sempre se desesperava por não conseguir conter a sua fúria. Ele ainda se lembra do natal de 2011, quando tentou se envenenar. Por sorte a sua pouca coragem o fez ligar para a urgência, que conseguiu o socorrer a tempo. Desde então, por mais que sua vontade de por fim na vida seja grande, ele decidiu nunca mais tentar o suicídio.

Seus planos eram os mesmos de todos os fins de ano em que passara depois que seu pai morreu. Comprar várias latinhas de cerveja, ligar a tv e ouvir os fogos de artifícios e as felicidades dos vizinhos em suas comemorações. Pensava em sair, procurar um bar ou algo assim, mas sabia que encontraria pessoas tão vazias e solitárias como ele. E seria bem mais deprimente.

Depois de várias latinhas, começou a devanear e a pensar nos motivos que o levava a não ter amigos, e a não receber um convite para passar tais datas comemorativas. O Natal ele até entendia, por se tratar de algo familiar. Mas o ano novo... Por que as pessoas o desprezam tanto? Ele sabia que o seu chefe só o tratava bem por que ele é ótimo no que faz. Se não, já teria o demitido.

Meia noite, os fogos explodiam em todo canto que se podia ouvir. Na tv passava um filme antigo de comedia, onde as cores preto e branco faziam jus ao humor pretendido. Olhou para a mão e tentou se lembrar qual o número da latinha que tinha, mas não conseguiu se lembrar. Foi até a janela, suspirando triste, e viu os flashs dos fogos estourando no céu estrelado.

Voltou para a sua poltrona, terminou a cerveja e acabou cochilando.

***

Uma pancada, em algum lugar, o acordou. Olhou em volta e estava tudo normal. A latinha ainda estava firme na mão, balançou e viu que ainda tinha um gole. Bebeu. Estava quente, mas não se importou. Olhou para a televisão e viu que o canal que assistia estava fora do ar, transmitindo somente aqueles chuviscos preto e branco, que dançavam na tela da tv. Levantou e foi até a geladeira, pegou mais uma. As musicas ainda estavam altas nos apartamentos, as risadas mais altas ainda.

- Alberto?

Alguém o chamou. Olhou ao redor, andou pela sala, vistoriou o quarto, mas nada viu. Olhou para a latinha em suas mãos e gargalhou. Algo engraçado, enfim. Uma historia que poderia contar para alguém no futuro, se aparecesse alguém que ele pudesse contar.

- ALBERTO, AQUI!

Deixou a latinha cair com o susto. A adrenalina fez expurgar todo o álcool que tinha no corpo. Pegou uma vassoura que estava perto e começou a andar lentamente, olhando em cada canto que poderia estar escondendo alguém.

- Não irei lhe machucar, Alberto. – Era voz de mulher.

- Quem está ai?

- Sou eu. Meu nome é Anna.

- Onde você está?

- Na televisão.

Ele quase riu, mas o medo travou seus lábios. Ele olhou pra tv e, acreditou, ver aqueles chuviscos ganhando a forma de um rosto humano. Não dava pra acreditar.

- Como você entrou ai?

- Isso não importa. O que importa é que vim te ver. Vim te fazer companhia.

- Como assim?

- Você pediu tanto pra ter uma pessoa, que alguém ouviu suas preces.

Ele tentou puxou a tomada, mas a televisão não desligou.

- Quem?

- Eu não sei. Eu só sei que quero sair daqui e ser sua.

Tudo aquilo era insano. Ele olhou em volta, tentando ver se havia algo diferente pois só podia ser um sonho. Se beliscou e sentiu a dor. Não, não estava sonhando.

- E por que não sai? – perguntou Allein.

- Estou presa aqui. Mas você pode entrar aqui comigo. – respondeu a mulher da televisão.

- Só pode ser louca.

- Tente colocar a mão na tela.

Ele o fez, e seus dedos entraram na televisão. Mas ele retirou rapidamente, assustando. Era como se seus dedos tivessem entrado numa gelatina.

- Viu? Você pode vim aqui comigo, passar o primeiro dia do ano, e depois sair. E voltar sempre que quiser.

- Como você é?

Aparece uma imagem colorida de uma linda morena, cabelos ondulados e olhos castanhos. Parecia perfeita demais para ser natural. Mas nada disso importou para Allein, que acabou ficando fascinado e hipnotizado por aquela morena. A imagem sumiu, e novamente voltou a aparecer aquele rosto deformado feito de chuviscos preto e branco.

- Você vem ou não?

- Estou indo.

Alberto Allein começou a entrar na televisão, aos poucos. Foi sumindo dentro daquele tubo que mal cabia uma perna. Após seu ultimo pé entrar dentro da tv, ela desligou e a sala de estar ficou completamente escura. Alguns poucos fogos ainda estouravam ao longe, as musicas ainda tocavam nos apartamentos, e uma sala de estar continuava em sua eterna solidão. Uma solidão que só foi quebrada cinco dias depois, quando o zelador e um grupo de vizinhos entraram no apartamento e acharam o corpo do homem sentado na poltrona, com sua barriga aberta, um rastro de sangue até a televisão e suas entranhas inexplicavelmente dentro do tubo da velha tv.

Fim!!!

terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Um Recado Pra Você

Você me usou, eu sei. Estava ciente de que isso poderia acontecer no momento em que lhe conheci. Mas sou um homem de esperanças, e de crenças. Acreditava que por debaixo desses olhos castanhos claros existiria uma mulher diferente das que encontramos aos montes por ai. Estava errado. Viver é cometer erros, eu sei disso, mas você foi um erro que me desestruturou. Sua beleza lhe leva em lugares tão diferentes da sua vida real, que lhe deixa fascinada. Você fica tão deslumbrada com essa vida, que acaba pisando nas pessoas que lhe estendem a mão. Talvez você tenha me visto como um homem que lhe levaria para essa vida, mas acabou vendo que eu não tinha todo esse recurso e acabou me jogando dentro do vazio da indiferença. Engraçado, uma mulher vinda de um relacionamento onde sofreu tanto deveria tratar com mais cuidado dos corações das pessoas que nutrem carinho por você. Nem todos têm a capacidade de aprender com o próprio sofrimento, e isso é tão triste. Você não aprendeu. Você só pensa em suas necessidades, em seus desejos, e acaba destruindo aquilo que realmente importa. Espero que um dia encontre a estrada certa. Espero que seu destino guarde bons acontecimentos, que lhe façam crescer e amadurecer de verdade.

O Amor Nada Insólito de um Poeta


“Ela sempre usa meu ombro como travesseiro enquanto mergulha em seu sono, após mais uma noite em que nossos corpos se encontraram mergulhados em um tesão frenético. Quase como sempre invado meus pensamentos, relembrando cada momento daquele jogo de sedução e de encontro carnal. Eu a amo, mas não sou correspondido. Sei que ela olha para mim e vê somente um homem que pode lhe satisfazer sempre que necessitar. Não estou reclamando, longe disso. Sei que ela não se importa com sentimentos, e nem sentiria alguma emoção se lhe mostrasse as poesias que lhe escrevo escondido nas profundezas do meu quarto. Se ela soubesse que por tantas noites de insônia, tendo como companhia uma caneca de café e livros de poesia, digitei em meu pc diversas declarações, talvez ela desistisse dessa relação casual e eu a perdesse por completo. Sou um poeta amedrontado pela possível perda de sua musa. Sou um escritor que se contentou em se alimentar de migalhas de atenção e carinho, abdicados de um sentimento profundo, e usando a solidão e tristeza como combustível para tantas produções. Meu quarto nada mais é do que um celeiro de papel A4 com rabiscos de um homem apaixonado, espalhados por cada canto me lembrando de que nessa canção ela é que dá o tom do coração. E eu canto.”

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

Lagrimas De Uma Bela Mulher

Conheci aquela criatura em um momento frágil, chorando por causa de dores desconhecidas por mim. As lagrimas vagueavam por aquele lindo rosto, e a tristeza lhe mascarava incansavelmente. Porém, mesmo com tais circunstâncias, em nada perdeu seu encanto. Mesmo com a delicada situação em que se encontrava, demonstrava a singularidade de sua personalidade. Tinha algo que prestava em sua cabeça, o que lhe diferenciava de quase todas as mulheres existentes, por isso resolvi não me aproximar. Era uma mulher destinada para grandes homens, e quem seria eu para chegar até ela? Afinal “Sou somente um rapaz latino americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes e vindo do interior”. Então, ateei-me em somente apreciá-la de longe, gastando a minha energia em registrar cada detalhe de seu rosto, para que poder recriá-lo em todas as noites quando ,balançando em minha rede, poderei adentrar em meu mundo particular e imaginar aquela doce menina em meus braços torrencialmente apaixonados.

Insônia

Esta noite eu tive insônia, pois ela não saia da minha cabeça. Poderia ser normal, comum, se a gente não tivesse se falado poucas vezes. É interessante como nossos sentimentos sempre andam em desacordo com a racionalidade, como um adolescente rebelde contra as autoridades dos pais. Essa noite foi mais especial do que a anterior, pois tive mais tempo para registrar cada detalhe do seu rosto, cada nuance do seu olhar, cada curva de seu sorriso. Talvez por ter mergulhado tanto nela deva ter perdido um pouco a minha paz. Não sei se receberei, novamente, mais uma ligação dela me convidando para sair, para conversarmos de assuntos profundos, banais, ou simplesmente ficar olhando o horizonte, sentindo a presença um do outro. Quem sabe o que o futuro guarda? Estradas, uma vez cruzadas, não se desunem jamais.

Ela Contra o Mundo

Sua independência impressiona os cavalheiros, sua autoestima desconcerta os cavalos. Ela é forte, com toques de meiguice que atrapalham as investidas dos mais experientes conquistadores de plantão. Ela sabe o que quer, e como fazer para chegar lá. Sua mente está no céu, mas seus pés estão tão firmes no chão que chegam a criar raízes. Difícil alguém que tente a conhecer seguir toda a sua energia, toda a vida que lhe pulsa em demasiada intensidade. Ela só precisa dela para enfrentar o mundo, e todos que entram em seu universo não entendem como ela conseguiu alcançar tamanha liberdade. Ela é uma ave livre entre gaiolas, uma planta teimosa no deserto. Ela é uma flor em eterno desabrochar, que encanta e assusta a todos os homens que lhe cruzam a estrada do destino. Ela é um poço infinito de descobertas, tesouro escondido, animal selvagem que jamais será domesticado por homens ínfimos como eu. Sua única paixão será a liberdade, e isso é o que a deixa mais bela e apaixonante.

sábado, 17 de dezembro de 2016

A Canção do Suicida

Durante a vida inteira
Eu vi você passar
Diante dos meus olhos
Sem ao menos me notar.

Você não tem noção
De como é torturante
Querer um dia lhe ter,
Pelo menos por um instante.

Mas você me desprezou,
Me jogou na solidão.
Agora te mostrarei
Toda a dor do meu coração

Não adianta nem me olhar,
Pois na lama me afundei.
Nada pode me resgatar,
Nem adianta ser cortês.

Nem sei se um dia amei.
Nem sei se amarei.
Minha única certeza é
Que meu coração dilacerei.

Estou todo enterrado nisso,
Sou um ser incompreendido.
Não me chamem de amor,
Muito menos de amigo.

Ouço as vozes de vocês
Querendo entender isso.
Lhes acalmo o coração
Bando de desconhecidos.

O vento bate no meu peito
Esfriando o meu coração.
Liberto-me dessa vida
Cantando esta canção.

A queda é longa e bela
Parece o sorriso dela.
Pra lhe ser verdadeiro
Eu queria era estar com ela

Vejo o susto de vocês
Quando no chão eu espatifei.
Meu sangue cheio de amor
Pelo chão todo se espalhou.

Ouço gritos, choros e prantos.
Vejo bem os olhos de tantos.
Vocês acham que eu acredito?!
Por ninguém serei reconhecido.

A morte já veio me buscar
E acabou de me avisar,
Minha dor não sumirá
Castigo por me suicidar.

Adeus, Adeus, Adeus, Adeus!
Eu culpo Deus por tudo isso.
Adeus, Adeus, Adeus, Adeus!
Até o inferno, meus amigos

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

O Poeta e a Musa Morta



Ele entrara no quarto, e ainda pôde ver o IML fechando o zíper do pacote com o corpo dela dentro. Seu rosto estava pálido, com uma paz incomum que só a Morte entende seu sentido. Em um dos cantos sua mãe chorava, tentando ser consolada por seu esposo que também desabava em agonia. O ar estava pesado, não somente pelo suicídio de uma jovem, mas pela cruel angustia de não saberem o motivo de ela ter amarrado seu lindo pescoço em uma corda e tirado sua vida. Mas ele sabia os motivos. Todos diziam que ela era uma jovem feliz, e com um grande futuro. Ele sabia que sorrisos, nos dias de hoje, são somente armaduras. Uma camuflagem eficiente para que ninguém saiba o que realmente está se sentindo. Talvez ele fosse o único que sabia dessa tristeza escondida em juventude, e por isso a amara tanto, mesmo sem nunca ter se declarado. Os homens do instituto passaram do lado dele, com o corpo dela, e não pôde deixar de pensar que se tivesse a presenteado com uma, das tantas poesias que ele escrevera em sua homenagem, talvez ela tivesse encontrado um motivo para viver. Talvez naquele momento, em vez de um corpo jovem morto, sendo colocado dentro de um camburão, houvesse uma moça com a vontade de viver renovada. Acredita-se que foi este o motivo dele virar um escritor assíduo, enviando suas poesias para o mundo em busca de redenção. Procurando corações amargurados que possam reviver seus sonhos graças as linhas e entrelinhas de suas poesias de solidão.

Um Bar Vagabundo

O contraste entre ele e aquele ambiente em que entrara era gritante. Suas roupas de marca impecavelmente passadas a gomo não combinavam com os trajes sujos e gastos dos que ali frequentavam. Seu carro de ultimo modelo brilhava mais do que o normal, perto das paredes monocromáticas e gastas do ambiente. Logo que entrou sua presença foi como um imã para os olhos dos vagabundos, ladrões e prostitutas que ali estavam. A música de longe era a de que estava acostumado a escutar com os seus amigos. Foi até o balcão e pediu uma cerveja para o garçom, que logo o entregou junto com um copo de vidro que acabara de limpar com um pano sujo. Sentou-se à mesa e despejou aquele liquido amarelo claro dentro do copo, e começou a beber, encharcando seus pensamentos com o álcool batizado. Uma das mulheres resolveu se antecipar as outras, e sentou ao lado do homem. Apoiou seu cotovelo na mesa, e pôs o seu queixo deitado na mão esquerda, enquanto a mão direita levava o dedo indicador nos braços daquele sujeito, fazendo uma leve dança de sensualidade, enquanto seus olhos fitavam o Rolex que brilhava em seu pulso.

 

- O que um homem como você está procurando num lugar como esse? – perguntou a mulher que já conhecera e deitara com tantos homens.

 

Ele ingeriu mais um gole da cerveja e vomitou a verdade.

 

- Solidão.
 
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Todos os direitos reservados. Essa obra é puramente ficcional, qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.

 

Acesse: http://escritorrenanmedeiros.blogspot.com

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Em Busca

Talvez ela queira me fazer de palhaço. Quem sabe seja essa a verdade. Não seria a primeira vez que uma mulher invadiria a minha vida unicamente para desestabilizar o meu coração solitário. Infelizmente tenho o defeito de atrair mulheres que querem unicamente relacionamentos rasos. Mas como pedir para o mar ser raso? Como pedir para uma ventania entregar uma leve brisa? Como pedir calmaria para uma tempestade revoltosa? Sou feito de emoções, transvestidas de uma carcaça de carne. Sou um velho ônibus que se cansou de ter passageiros. Mulheres indo e vindo, usando o meu coração como passarela para estradas que nem elas mesmas sabem qual seguir. Sou um homem em busca de certezas, encontrando somente corações cheios de dúvidas, medos e angustias. Um homem cansado da solidão produzida por gente em busca de companhia.

Uma Visita

Aqueles olhos castanhos mergulhavam nos pensamentos, resgatando lembranças que se libertavam entre aqueles lindos lábios vermelhos. Ora ou outra ela me olhava, querendo que eu falasse um pouco sobre mim. Mas eu não conseguia. Buscava as palavras, como um homem busca oxigênio ao se afogar. E eu estava me afogando na beleza daquela criatura perfeita. Ficava emudecido, gastando minha energia em captar todos os detalhes desta linda mulher. Queria poder passar toda a noite ali, navegando por aqueles olhos e vendo-os fecharem de sono. Gostaria de poder acordar e vê-los abrir pela manhã, seguidos daquele sorriso cativante. Mas uma simples visita não poderia durar tanto tempo assim. Acabei tendo que partir, mas com a satisfação de que as lembranças seriam pulsadas pelas artérias do coração até chegar ao meu espirito apaixonado.

sábado, 27 de agosto de 2016

Faíscas do Passado

Havia uma centelha de lembrança em sua cabeça. Uma singela faísca do passado que ele não conseguia apagar. Viemos á este mundo destinados a grandes criações, mas fadados a sucumbir diante das pequenas coisas. Adoecemos graças a pequeníssimas criaturas, e enlouquecemos devido a pequenas lembranças. E ele estava perdendo a sanidade por causa dela. Ela não existia mais. Pelo menos não na sua vida.  Ela estava em algum lugar, respirando algum ar, rindo de alguma piada e comendo alguma comida. Estava acompanhada dos amigos, talvez até de alguém que esteja apaixonado. Alguém que a esteja amando, da mesma forma que ele a amou. Este pequeno sentimento ainda se agarra no peito dele, cravando suas unhas, gritando, lutando para manter sua existência. Dói. Tentar arrancar esta criatura, chamada Amor, dói. Mas ele luta pela sobrevivência. Ele persiste em continuar vivendo, sem tê-la ao seu lado. Um mero corpo vazio de futuro, expirando um ar de desesperança, encharcado de lembranças desse amor que nunca mais voltou.

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Um Mundo no Homem

Ele estava sentado no banco da praça, olhando as pessoas se divertindo. Sua mão percorreu o cimento do assento, imaginando todas as bundas que ali já haviam passado. Olhou para aquelas pessoas e pensou no quanto elas eram felizardas por estarem ali, livres e felizes. Nem que fosse uma felicidade momentânea, naquele instante, mas estavam felizes. Pensou no mundo, em seu tamanho colossal, e nos milhares de almas respirando naquele momento. Pensou nas mortes, nas guerras, nas tragédias, nas humilhações... Tudo acontecendo ao mesmo tempo, e aquelas pessoas brincando na praça. “Temos que seguir a vida, mesmo com tudo isso”, foi o que ele ouviu de conselho uma vez. Mas a alma daquele rapaz não conseguia abraçar esse egoísmo. Ele já não era um homem no mundo, mas um mundo no homem. Conseguia sentir cada dor, cada lagrima de tristeza lavando a terra. Não era algo que ele conseguia controlar, era uma força que ele desconhecia sua origem. Só sabia que estava ali, dentro do seu peito. Uma energia que lhe motivava a gritar. Ai ele lembrou que seu Playstation 4 lhe aguardava no seu quarto, levantou e foi embora. E as pessoas continuaram brincando, sem ouvirem os gritos de agonia de um planeta abandonado.

domingo, 31 de julho de 2016

Briga de Idosos

Todas as pessoas que estavam passando por ali pararam para ver a discussão, que já tinha virado combate físico. Dois homens de idade brigavam dentro de uma arena feita com corpos dos curiosos. Alguns filmavam, outros assistiam torcendo por um dos lutadores, e ainda havia aqueles que queriam que alguém desse um fim na luta; mas não tinham coragem de separar os homens.

O homem de barba branca conseguiu acertar um cruzado de direita na boca do velhinho careca, jogando a dentadura dele, que caiu em cima de um sorvete de uma criança. O careca, furioso, levantou a perna para lhe dar um golpe no peito, mas seu reumatismo só o deixou acertar o joelho de seu adversário.

O homem de barba foi mancando até o seu inimigo, dando vários socos que só acertavam o ar. O careca se esquivava, mesmo com os dois metros de distancia que os separavam. O carequinha, vendo uma brecha na defesa do barbudo, correu para cima dele, agarrando seu tórax e dando vários socos na costela do adversário.

O barbudo aproveitou e começou a socar a cabeça do carequinha, que logo o soltou e caiu de bunda no chão, tonto pelas pancadas. A torcida comemorou a provável vitória do desconhecido.

O carequinha ficou olhando o vencedor comemorar, sob os gritos dos curiosos que lhes haviam rodeado. O barbudo se aproximou, sorrindo, apontou o dedo na cara do perdedor e gritou:

- E nunca mais tome o meu Toddynho.

E saiu, abrindo espaço entre as pessoas que o observava emudecidas.

Renan Medeiros
Breves, 31 de julho de 2016

sexta-feira, 29 de julho de 2016

Entrega

Aquele cheiro de moça virgem,
E aquela pele intocada.
Fui o primeiro homem
Que aquela vagina desbravara.

Rompi com a pele de sua mocidade,
Tornando-lhe uma mulher, enfim.
Os anjos ouviram seus gemidos,
Quando você se entregou para mim.

O melhor não foi suas pernas abertas,
Nem o gosto de sua entrega à paixão.
Mas acordar no dia seguinte e lhe ver ali,
Adormecida e satisfeita no meu colchão.

Renan Medeiros
Breves, 26 de julho de 2016

Cansou

Ele cansou de esperar. Seus olhos já não brilham mais quando a vê, mas enchem-se de tristeza ao se lembrar de tanta magoa que ela já lhe fez. Esperou... Esperou por um amor prometido que se escondeu nas profundezas de uma existência que se encarcerou por muros de medos e lamentações. Ele procurou certezas, mas só encontrou duvidas. Ele queria uma mulher com os pés no chão, mas encontrou somente pés atolados em incertezas. A fadiga da espera pesou, e resolveu abandonar a imortalidade da esperança. Agora só lhe resta vaguear pelo finito tempo de sua breve existência nesse plano.

Renan Medeiros
Confissões Testosterônicas
Breves, 29 de julho de 2016

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Meu Amigo Virou Escritor, e Agora?!

Primeiramente, gostaria de lhe falar que seu amigo não virou escritor, de uma hora pra outra, mas ele já era escritor há muito tempo. Você nunca notou as horas que ele passava trancado no quarto, escrevendo suas historias e versos? Se não, entendo o susto que levou quando ele veio lhe mostrar o seu primeiro livro publicado.

As coisas mudarão drasticamente, pois agora conheces o segredo artístico do seu amigo. Lamento lhe informar, mas as conversas que vocês tinham, e terão, para ele não eram/é/serão uma simples conversas. Você acreditava que estava jogando conversa fora com um amigo, mas ele estava se nutrindo do seu ser, da sua personalidade, dos seus conhecimentos e crenças, para poder dar vida a muitos personagens que ele criou e criará. Cada olhar do seu amigo será uma navalha penetrando a sua carne, querendo desnudar seu verdadeiro eu.

Calma! Também não precisa sair correndo. Ter um amigo escritor têm lá suas vantagens. Você agora tem um amigo ótimo para ouvir seus problemas, mesmo que ele vá se aproveitar disso. Um amigo que postara mensagens lindas no Facebook no seu aniversário, lhe dará poemas de amor para você enviar para as suas paqueras e lhe convidará para os coquetéis/sarais//eventos que ele for convidado.

Mas você também terá deveres a cumprir, como ler suas obras antecipadas para lhe fazer uma analise critica e suportar seu péssimo humor oriundo de uma constipação mental. Ser escritor é ser anormal, e os amigos destes devem ser tolerantes para com as suas loucuras. O escritor não vê o mundo como os outros, e precisam de pessoas que entendam isso do lado delas.

Por fim, há algo que você jamais deve esquecer. Nunca, em hipótese alguma, esqueça-se de lhe desejar um feliz dia do escritor. Para quem não sabe é hoje, dia 25 de julho. Parabeniza-lo nesse dia o fará esquecer de todo os textos de qualidade duvidosa que ele já escrevera, e dará um tapa positivo na autoestima dele.

Por falar nisso, aguardo minhas congratulações.

Abraços.

terça-feira, 12 de julho de 2016

Um Último Texto

Uma sensação que transforma qualquer homem em esterco. Ele pode ser o mais machista e mulherengo que for, mas quando há sentimento verdadeiro renegado por uma mulher ele se contrai de volta em um útero imaginário e contempla o suicídio lento e gradual de seu ego com sua autoestima.

Deveria ser crime envolver alguém em um circulo de emoções e sentimentos bons e depois, simplesmente, coletar tudo isso e arremessar em um abismo de tristeza. Por que há quem faça isso com alguém? Desconheço. Talvez nunca vá entender o porquê de ela me banhar com sua doçura e, sem nem ao menos me preparar, salpicar minha paixão com um desprezo frio.

“Qualquer mulher amaria namorar você”, foi o que ela me disse. “Menos você”, pensei. De tantas, foi ela que eu quis. E de todas, foi ela que me encarcerou dentro de um mar de questionamentos sobre o porquê de ter começado a me encher de esperanças e, depois, rompido este cordão umbilical que estava começando a se formar entre a gente.

Tenho uma carcaça calejada de “foras” na vida e da vida, e isso faz parte dessa pequena trajetória que travamos nesse plano da existência. Talvez por isso não mais me encarcere em sentimentos vis de dor, e continue a sorrir e viver como se nada tivesse acontecido. O mundo lá fora não tem culpa de nossas decepções, as pessoas não tem culpa de alguém ter virado a cara para nossos sentimentos. Acho essa uma lição valida, para todos, por mais que seja difícil.

Não é ser hipócrita, ou falso, ou alheio aos nossos sentimentos internos. É simplesmente não nos apegarmos a eles. Deixarmos, sim, eles lá dentro, pulsando, consumindo nossas energias. Mas sem abraçar-lhes e dizer que o amamos, e sair por ai danificando a vida alheia com estes sentimentos que nem mesmo nós queremos para si. O certo é deixar ele incógnito, até que o alimento acabe e ele morra desnutrido.

Passarei um tempo, dois meses (talvez menos) sem escrever. Irei debruçar-me sobre a literatura da arte de cuidar para fazer um concurso, mas antes disso eu tinha que escrever esse ultimo texto. Então, não é O ultimo texto, mas um ultimo texto. Um texto necessário para expurgar essa historia da minha vida e poder continuar a devanear em tantas outras áreas que amo escrever.

Talvez, eu apareça de repente nessa curta trajetória de estudos para vos relatar algo. Sabe como é a cabeça de um escritor, não para. E quem sabe esses gritos eloquentes da minha mente não seja a linha tênue que me segura entre a sanidade e a loucura.

Abraços!

sábado, 9 de julho de 2016

Assombrações Existem?

Quando criança tinha medo do escuro. Um medo comum, que com o tempo foi superado. Mas na época da minha infância eu tinha pavor do escuro. Hoje sei que meu medo não era do escuro. Ninguém tem medo do escuro. As pessoas temem o que se esgueira na escuridão. Tememos aquilo que a escuridão pode esconder. Hoje sei que não existe nada que a escuridão esconda, além daquilo que vemos na claridade. Bom, era o que acreditava. Aliás, ainda acredito. Tenho um ceticismo forte, que me faz descrer em tantas coisas que ouço... e vejo. Sim, já tive minhas experiências inexplicáveis. Com o tempo o medo do escuro – ou do que o escuro possa esconder – passou, e o ceticismo aumentou. Até que um dia alguma força diferente resolveu me mostrar que não estava ausente. Era noite do Dia dos Finados, estava na cozinha acessando as redes sociais. Quando a madrugada chegou, resolvi ir para o meu quarto dormir. Na época a televisão era ligada a um nobreak, que só ligava se apertasse com certa força por alguns segundos. O cansaço era enorme, e me joguei na cama. Segundos se passaram quando escutei o barulho do nobreak sendo ligado, e em seguida o quarto sendo iluminado pela luz da televisão. Levantei, desliguei e voltei a deitar, no escuro; pois já dormia no escuro. Deitei como se nada tivesse acontecido, como se não estivesse acompanhado naquele quarto. Deitei e dormir. Aquilo não parou. Os dias seguintes passaram com panelas batendo, rádio sendo ligado sozinho, etc. Continuava agindo naturalmente, como se tudo aquilo tivesse uma explicação natural – e não tinha. Até que, da mesma forma que veio, se foi. E nunca mais tive nenhuma dessas experiências. Não sei se cansaram de brincar com alguém que não deu atenção, ou se realmente tudo tinha uma explicação que até hoje não encontrei. Só sei que aconteceu, e não acontece mais. Hoje continuo dormindo no escuro, mas com o restante das luzes da casa acessas. Não pelo medo de ter que ir ao banheiro no escuro e encontrar um espírito, mas o medo de algum ladrão resolver se aventurar e invadir a minha casa. Assombrações existem? Não sei. Mas uma coisa eu tenho certeza, os demônios personificados em gente estão causando um caos na pequena cidade de Breves.
Que Deus nos proteja.

sexta-feira, 8 de julho de 2016

A Menina com a Caneca de Café

Estava naqueles dias onde os olhos vagueiam pela vida em busca de algo, sem necessariamente saber o que é este algo que tanto o coração de escritor procura. Um objeto, um acontecimento, uma cena inusitada, o voo de um pássaro, ou o simples caminhar de um casal de namorados. Sem compromissos ou imposições, um simples passeio ocular em torno de tudo, mas sem se atentar a nada. Nutrindo-me com tudo em minha volta, cada espetáculo particular da vida alheia registradas em fotografias cerebrais de um simples homem com um lápis e papel em mãos. Mas nada, ainda, havia me retirado da zona de conforto a ponto de abolir meu passeio visual em inquietações literárias e por minhas mãos em uma alergia enérgica capaz de me fazer escrever. Nada, até vê-la. Uma simples mulher, ao longe, sentada em uma cadeira de plástico, debruçado sobre a mesa e com uma caneca com café em mãos. Seus cabelos negros debruçavam, levemente, sobre o olho direito, enquanto lia algum livro que estava repousando sobre aquela mesa. A caneca de café extinguia seu doce cheiro em leves fumaças esbranquiçadas, que saiam dançando aos braços do galanteador vento de julho. Seus olhos faziam o movimento de ir e vir, acompanhando as palavras do livro, que se organizavam em linhas e parágrafos e formavam uma historia capaz de prender a atenção daquela doce garota. Mas, no fundo, algo não estava certo. Seu olhar, mesmo atendo ao universo escrito por um autor que desconheço, se perdia. Era segundos, mas perceptíveis. Como se, em certos momentos, ela fosse resgatada à realidade por alguma acusação de seu cérebro, ou pelas labaredas de lembranças pelas quais ela queria esquecer. Um café e um livro, sendo utilizados para resgatar um pouco da sanidade daquela moça, que se perdia em algum problema enigmático para mim. Mas nem a cafeína, nem as brincadeiras literárias daquele livro, eram capazes de tirar aquela jovem de suas angustias. Ela levantou o olhar, fitou o céu como se desejasse ser levada por alguma força desconhecida, e suspirou. Fechou o livro, bebeu o ultimo gole no café, deixou o dinheiro 2016 na mesa e se retirou, desfilando sua beleza pelas calçadas da praça; sem ser notada por ninguém, exceto por um escritor que talvez ela nunca tenha ouvido falar (e quem sabe nunca ouvirá).

quarta-feira, 6 de julho de 2016

Noite de Descobertas

"Ela foi andando na frente, com um olhar safado e aquele babydool que deixa a poupa da bunda a mostra. Soube andar na medida certa; nem tão devagar a ponto que eu pudesse ver todos os detalhes, nem tão rápido a ponto de não me enlouquecer de tesão. Sumiu atrás da cortina que dá acesso ao quarto, me deixando com o desejo de desbravar aquela escuridão em busca do eldorado entre suas pernas. E como bom aventureiro, não pude negar o convite tentador. Foi uma longa noite de descobertas"

quinta-feira, 30 de junho de 2016

A Maldição do Escritor

Não adianta. Você pode até tentar, mas se nasceu escritor não irá conseguir fugir de seu destino. O mundo não será mais um simples mundo, cada átomo existente lhe proporcionará milhares de historias pra contar. Você será garimpeiro, adentrando a vida alheia com conversas e perguntas, procurando dissecar a vida humana, seus medos, sonhos, relacionamentos. Você pode até tentar parar de escrever, mas sua alma não irá aceitar. Você será bombardeado por insights, sacadas, frases geniais para textos sobre isso e aquilo. Você não irá pegar em uma caneta, nem sentará na frente de um computador, mas seu cérebro continuará a escrever, e escrever, e escrever... Até sentir que está perdendo o controle, enlouquecendo, afogando-se em palavras, prosas e poesias. E irá sucumbir se não voltar a produzir, a deixar as águas fluírem para o papel. Você é escritor, transborda historias. Seu cérebro é inquieto, seus olhos atentos, seus ouvidos abertos, seus dedos trementes. Não há como fugir, é nossa maldição.

quarta-feira, 29 de junho de 2016

Creuzina, Crodoaldo e Crodoberto

Ouçam minha canção
Com os ouvidos bem abertos
É a historia da Creuzina,
Crodoaldo e Crodoberto.

Crodoaldo era irmão
Do moço Crodoberto
Crodoaldo era a unha
A carne era Crodoberto

Para onde um deles ia
O outro ia atrás
Dividiam tudo que tinham
Mas a cueca era demais

Mas um dia tudo mudou
Crodoaldo se apaixonou
Pela moça Creuzina
Que na cidade chegou.

Moça bela, moça formosa
Com um sorriso de matar
Foi só ver o Crodoaldo
Começou a se insinuar.

Começaram a namorar
Escondidos do povão
Creuzina era de família
Não chamava a atenção

Todo mundo estranhou
Com o sumiço de Crodoaldo
Crodoberto se desesperou
Pois não sabia desse caso.

Certo dia pela cidade
Procurando o irmão
Encontrou a Creuzina
Ficou de boca no chão.

Ela viu aquele homem
E sentiu um comichão
Mal trocaram uma palavra
Começou a pegação

A putaria rolou solta
Sem os irmãos desconfiar
Mas uma cidade pequena
Ninguém consegue enganar

Logo veio os comentários
De toda a população
Creuzina pegava Crodoaldo
E se esfregava no irmão.

Todos riam pelas costas
Os irmãos sem entender
Que de tanto dividirem
Chifres começaram a ter

Então veio a noticia
E a situação piorou
Creuzina se meteu em rabo
O fogo dela incendiou

O medico deu a noticia
Que resultou da pegação
Dentro daquela barriga
Crescia um meninão.

Deu a noticia a Crodoaldo
Informou a Crodoberto
Mesmo sem saber quem era
O verdadeiro pai daquele feto

Crodoaldo se encantou
Crodoberto se maravilhou
E para a moça Creuzina
Cada um se declarou

Crodoaldo pediu a mão dela
Crodoberto o fez também.
Sem saber o que fazer
Para ambos disse “Amém”.

Ambos marcaram o mesmo dia
Para no cartório se casar.
Creuzina se desesperava
Pois eles iam a matar.

Chegou no dia do casório
O juiz a se ajeitar
Crodoaldo chegou de carro
Crodoberto já estava lá

Ambos não entenderam nada
A presença do irmão.
Creuzina chegou assustada
Explicou a situação.

A historia se espalhou
Do que lá aconteceu
Os dois se agarraram
O juiz se escafedeu.

Ambos estão na cadeia
Pela briga que ocorreu
Dividindo a mesma cela
Pedindo perdão até a Deus.

Creuzina ficou de fora
Vejam só a situação
Foi até uma consulta
Com o medico Tonhão.

Tonhão se encantou
Com aquela moça consultada.
Então lhe cortejou
E a levou pra sua casa.

Creuzina tem vida boa.
Se esqueceu dos dois irmãos.
Pois agora tem um medico,
Jardineiro e o Ricardão.

Os dois presidiários
Voltaram a se falar.
Voltaram a dividir tudo
Até o vaso de cagar.

Finalizo minha canção
Com a certeza do que direi
Mulher é um bicho doido
Mas tô louco pra uma ter

quinta-feira, 16 de junho de 2016

Uma Gota do Passado

Não sei ao certo a idade, mas eu era uma criança. Me destacava das outras, não por inteligência, ou força, ou tamanho, ou agilidade e destreza nos esportes – era tão comum quanto os outros. Destacava-me pelo fato de ser o mais antissocial da sala. De poucas palavras e muitos olhares, possuía um circulo de amizade que se resumia a uma pessoa; aumentava se eu levasse em conta meus amigos imaginários.

Acontece que era uma criança com um desenvolvimento normal, e logo a puberdade chegaria, os hormônios invadiriam meu corpo e eu iria começar a ver, sentir e desejar coisas que ainda passavam longe de meus pensamentos. E ele chegou, com força.

Foi na quinta serie que eu conheci o forte desejo pelo corpo feminino, que comecei a adentrar nas curvas insinuadas da delicadeza deste ser divino. A partir dai meu desenvolvimento abandonou o barco da normalidade, e mergulhou na tortuosa tempestade da confusão da adolescência.

Poderia continuar tendo um avanço emocional, físico e psíquico retilíneo, se eu não conhecesse uma doce garota que me encantou. Sim, havia garotas na sala de beleza mais gritante, algumas já beirando o corpo de mulher, e outras mais “pra frente” com os outros rapazes, sendo mais fácil uma conquista masculina. Mas foi aquela delicadeza angelical, e uma maturidade singular, que me fez perder o controle de minha existência.

Apaixonei-me por ela.

Mas o que acontece quando um pequeno rapaz, solitário, sem o desenvolvimento profundo sobre as relações humanas e de poucas palavras acaba se apaixonando por uma das garotas mais belas da sala? Acertou quem respondeu: um trauma.

Nunca consegui dizer-lhe o quanto a amava (seria amor?), só insinuava o desejo. Como meu conhecimento era acima da média, acabava sendo convidado pelo grupo dela a fazer os trabalhos em equipe. Ter ela por perto às vezes me desconcentrava e desconcertava, mas sempre desejava que ela ficasse ali, ao meu lado, para sempre.

Foram quatro anos estudando com ela. Com o decorrer dos anos letivos, mais pessoas acabavam desconfiando, e sabendo, desse sentimento. Não tive olhos para mais nenhuma garota, o que decorreu minha completa falta de habilidade na aproximação com mulher; pois como não me interessavam, não me aproximava e não me desenvolvia.

Ia nas festas da escola (era o Santo Agostinho), inclusive em “haves” (ou seria raves?), com a decisão de me aproximar e, enfim, revelar o que sentia. Nunca chegava a coragem, nunca aproveitava a festa, sempre me sentia um panaca.

Nos formamos, e nos separamos. Seguimos estradas distintas, e infinitamente distantes. Em raras ocasiões eu a vejo, e sinto que aquele sentimento, bem no fundo do coração, ainda existe. Sentimento bom, admito. Lembranças felizes, acima de tudo. Talvez tenha sido melhor assim, pois foi na solidão que brotou esta pobre mente conturbada por historias. Virei escritor.

E não é que a loucura é palco da arte?!

domingo, 12 de junho de 2016

Por que certos casais não assistem pornô juntos

Ela – Já começou, amor?
Ele – Já têm umas meia hora.
Ela - Desculpe, fui fazer a pipoca.
Ele - Pipoca?
Ela - Sim, não vamos ver filme?
Ele - Sim, mas é pornô.
Ela - E dai?
Ele - Dai que ninguém vê filme pornô comendo pipoca.
Ela - Você é muito certinho.
Ele - Não sou nada.
Ela - Bom... Aproveitei também pra lavar a louça do jantar que você deixou na pia
Ele - Eu ia lavar amanhã.
Ela - Sabe que não gosto de ver a pia com louça suja.
Ele - Tudo bem. Vamos ver o filme, que tá interessante.
Ela - Quem é o mocinho?
Ele - Que mocinho?
Ela - O mocinho... O cara bom do filme.
Ele - Nesse tipo de filme não tem mocinho ou vilão. Bom, depende do ponto de vista.
Ela - Como assim?
Ele - Têm uns atores que gostam de dar uns tapas, engasgar, essas coisas.
Ela - Credo! Maria da Penha neles.
Ele - É um filme, amor.
Ela - Mesmo assim. Eles instigam à violência doméstica mostrando essas coisas.
Ele - Nada a ver. Vamos ver o filme.
Ela - Já tô aqui há uns dez minutos e até agora ela só fez chupar o cara.
Ele - Esses filmes são assim.
Ela - Mas precisa demorar tanto tempo chupando?
Ele - Sei lá.
Ela - Como ela consegue por tudo isso na boca?
Ele - Nem é tão grande assim. E você também consegue.
Ela - Consigo, mas o teu não é tudo isso ai. Isso é aí é uma monstruosidade de enorme.
Ele - ...
Ela - Que foi?
Ele - Nada não.
Ela - Ela se levantou, acho que vai começar a ação.
Ele - Sim!
Ela - Como é o nome dessa meia mesmo?
Ele - Meia-calça?
Ela - Acho que tem outro nome.
Ele - Não sei.
Ela - Pensei que soubesse.
Ele - Nem tinha reparado que ela estava usando isso.
Ela - Tá olhando o que então?
Ele - Tudo, menos as roupas.
Ela - Oooowwwnn, que francesinha sensacional.
Ele - Não é assim que chama.
Ela - Como não?
Ele - É espanhola.
Ela - Tá doido? É francesinha.
Ele - Espanhola.
Ela - Quer saber de unha mais do que eu?
Ele - Unha?!
Ela - Sim, unha.
Ele - Ah, sim.
Ela - É francesinha ou não é?
Ele - Sim, é... Olha só onde ela conseguiu colocar a perna!
Ela - Ela é um pouco flexível.
Ele - Um pouco?
Ela - Sim, um pouco.
Ele - Achei bastante.
Ela - Grandes coisa.
Ele - Você não consegue por a perna nem metade de onde ela colocou.
Ela - E dai?
Ele - Bora ver o filme.
Ela - Ela geme muito.
Ele - Geme.
Ela - Isso não é normal.
Ele - Aí ela está atuando, mas há mulheres que são assim.
Ela - Como você sabe disso, Graucilando?
Ele - Sei o que?
Ela - Que têm mulheres que gemem muito.
Ele - Só sei.
Ela - Fala logo.
Ele - Há, meus amigos me contam suas aventuras.
Ela - Amigos é? Aventuras é?
Ele - Olha, nunca fizemos essa posição.
Ela - E dai?
Ele - Quer fazer?
Ela - Faz com essas pequenas que gemem muito.
Ele - Não tem ninguém, amor.
Ela - O que ela vai fazer com esse cabo de vassou... JESUS!
Ele - Até eu fiquei besta com essa.
Ela - O que essa mulher tem entre as pernas? Um buraco negro?
Ele - Ela é fogosa.
Ela - Graucilando?!
Ele - Oi.
Ela - O que é isso crescendo na sua calça?
Ele - Tanto tempo que tu não usa que já esqueceu?
Ela - Nem vem com tuas graças. Tá excitado com essa putinha ai?
Ele - Não amor. É que tô imaginando nós dois fazendo isso.
Ela - Com o cabo de vassoura?! Tá louco?!
Ele - Não, amor. Tudo, menos essa parte.
Ela - Por quê? Acha que não dou conta?
Ele - Não, amor. Não é isso.
Ela - PEGA A VASSOURA, AGORA!
Ele - Deixa disso, coração.
Ela - Deixa que eu mesmo pego.
Ele - ...
Ela - Olhe bem, Graucilando.
Ele - Esquece isso, Mauriciscleide. Vamos voltar a ver o filme.
Ela - Nada disso. Olha só... Tá vendo?... Huuumm... Viu como ela não é nada demais... Qualquer uma consegue... Vou girar pra tu ver... Esse sangramento é normal?... Graucilando, tô tonta.
Ele - Meu Deus do céu, Mauriciscleide!
Ela -...

***

Ele - Amor?
Ela - Onde estou?
Ele - No hospital. Você perdeu muito sangue e desmaiou.
Ela - Meu Deus!
Ele - Mas não se preocupe, você está bem. De manhã, dependendo dos exames, poderemos voltar pra casa.
Ela - Nunca mais pego num cabo de vassoura.
Ele - Isso é pra tu aprender.
Ela - Graucilando?
Ele - Oi?
Ela - Posso te fazer uma pergunta?
Ele - Claro?
Ela - Como acabou o filme? O mocinho venceu?
Ele - ...

FIM

Renan Medeiros
Breves, 12 de junho de 2016
FELIZ DIA DOS NAMORADOS

Por que certos casais não assistem pornô juntos

Ela – Já começou, amor?
Ele – Já têm umas meia hora.
Ela - Desculpe, fui fazer a pipoca.
Ele - Pipoca?
Ela - Sim, não vamos ver filme?
Ele - Sim, mas é pornô.
Ela - E dai?
Ele - Dai que ninguém vê filme pornô comendo pipoca.
Ela - Você é muito certinho.
Ele - Não sou nada.
Ela - Bom... Aproveitei também pra lavar a louça do jantar que você deixou na pia
Ele - Eu ia lavar amanhã.
Ela - Sabe que não gosto de ver a pia com louça suja.
Ele - Tudo bem. Vamos ver o filme, que tá interessante.
Ela - Quem é o mocinho?
Ele - Que mocinho?
Ela - O mocinho... O cara bom do filme.
Ele - Nesse tipo de filme não tem mocinho ou vilão. Bom, depende do ponto de vista.
Ela - Como assim?
Ele - Têm uns atores que gostam de dar uns tapas, engasgar, essas coisas.
Ela - Credo! Maria da Penha neles.
Ele - É um filme, amor.
Ela - Mesmo assim. Eles instigam à violência doméstica mostrando essas coisas.
Ele - Nada a ver. Vamos ver o filme.
Ela - Já tô aqui há uns dez minutos e até agora ela só fez chupar o cara.
Ele - Esses filmes são assim.
Ela - Mas precisa demorar tanto tempo chupando?
Ele - Sei lá.
Ela - Como ela consegue por tudo isso na boca?
Ele - Nem é tão grande assim. E você também consegue.
Ela - Consigo, mas o teu não é tudo isso ai. Isso é aí é uma monstruosidade de enorme.
Ele - ...
Ela - Que foi?
Ele - Nada não.
Ela - Ela se levantou, acho que vai começar a ação.
Ele - Sim!
Ela - Como é o nome dessa meia mesmo?
Ele - Meia-calça?
Ela - Acho que tem outro nome.
Ele - Não sei.
Ela - Pensei que soubesse.
Ele - Nem tinha reparado que ela estava usando isso.
Ela - Tá olhando o que então?
Ele - Tudo, menos as roupas.
Ela - Oooowwwnn, que francesinha sensacional.
Ele - Não é assim que chama.
Ela - Como não?
Ele - É espanhola.
Ela - Tá doido? É francesinha.
Ele - Espanhola.
Ela - Quer saber de unha mais do que eu?
Ele - Unha?!
Ela - Sim, unha.
Ele - Ah, sim.
Ela - É francesinha ou não é?
Ele - Sim, é... Olha só onde ela conseguiu colocar a perna!
Ela - Ela é um pouco flexível.
Ele - Um pouco?
Ela - Sim, um pouco.
Ele - Achei bastante.
Ela - Grandes coisa.
Ele - Você não consegue por a perna nem metade de onde ela colocou.
Ela - E dai?
Ele - Bora ver o filme.
Ela - Ela geme muito.
Ele - Geme.
Ela - Isso não é normal.
Ele - Aí ela está atuando, mas há mulheres que são assim.
Ela - Como você sabe disso, Graucilando?
Ele - Sei o que?
Ela - Que têm mulheres que gemem muito.
Ele - Só sei.
Ela - Fala logo.
Ele - Há, meus amigos me contam suas aventuras.
Ela - Amigos é? Aventuras é?
Ele - Olha, nunca fizemos essa posição.
Ela - E dai?
Ele - Quer fazer?
Ela - Faz com essas pequenas que gemem muito.
Ele - Não tem ninguém, amor.
Ela - O que ela vai fazer com esse cabo de vassou... JESUS!
Ele - Até eu fiquei besta com essa.
Ela - O que essa mulher tem entre as pernas? Um buraco negro?
Ele - Ela é fogosa.
Ela - Graucilando?!
Ele - Oi.
Ela - O que é isso crescendo na sua calça?
Ele - Tanto tempo que tu não usa que já esqueceu?
Ela - Nem vem com tuas graças. Tá excitado com essa putinha ai?
Ele - Não amor. É que tô imaginando nós dois fazendo isso.
Ela - Com o cabo de vassoura?! Tá louco?!
Ele - Não, amor. Tudo, menos essa parte.
Ela - Por quê? Acha que não dou conta?
Ele - Não, amor. Não é isso.
Ela - PEGA A VASSOURA, AGORA!
Ele - Deixa disso, coração.
Ela - Deixa que eu mesmo pego.
Ele - ...
Ela - Olhe bem, Graucilando.
Ele - Esquece isso, Mauriciscleide. Vamos voltar a ver o filme.
Ela - Nada disso. Olha só... Tá vendo?... Huuumm... Viu como ela não é nada demais... Qualquer uma consegue... Vou girar pra tu ver... Esse sangramento é normal?... Graucilando, tô tonta.
Ele - Meu Deus do céu, Mauriciscleide!
Ela -...

***

Ele - Amor?
Ela - Onde estou?
Ele - No hospital. Você perdeu muito sangue e desmaiou.
Ela - Meu Deus!
Ele - Mas não se preocupe, você está bem. De manhã, dependendo dos exames, poderemos voltar pra casa.
Ela - Nunca mais pego num cabo de vassoura.
Ele - Isso é pra tu aprender.
Ela - Graucilando?
Ele - Oi?
Ela - Posso te fazer uma pergunta?
Ele - Claro?
Ela - Como acabou o filme? O mocinho venceu?
Ele - ...

FIM

Renan Medeiros
Breves, 12 de junho de 2016
FELIZ DIA DOS NAMORADOS

quarta-feira, 30 de março de 2016

O Lado Oculto da Cidade de Breves

Eu morri e neguei-me a libertação ou o eterno castigo. Preferi vagar, eternamente, entre o mundo e o submundo, vendo os homens e mulheres viverem e os fantasmas se torturarem. Não existo, existindo. Posso estar ao seu lado, sem ao menos ser notado. A morte ainda caminha atrás de mim, seguindo meus passos. Ainda acredita que me entregarei a ela para que me leve até a luz. Mas não, não é isso que desejo. Depois que meu corpo apodreceu em um tumulo, minha visão se abriu para muitos mistérios que se escondem sob o véu da morte. E são esses mistérios escondidos que lhes contarei, um por um. Tais mistérios vêm como visões. Relâmpagos de lembranças de almas torturadas por demônios de suas mortes. Vejo uma fila de casas, de madeira, quase idênticas. Sobre elas se debruça uma enorme castanheira com castanhas cor de sangue. Elas caem, servindo de alimento para corpos mortos que saem da terra. Corpos gementes com olhos de leite e gangrenas purulentas. Que historia horrível se passou aqui.

1 – A Castanheira

Quem sabe o que se esconde nas profundezas de onde pisas? Há mais mistérios escondidos nos grãos de areia desta terra, do que na obscuridade insalubre da mente de um psicopata homicida.

Hoje olhamos para essa cidade, com seus pavimentos e asfaltos. Com as pessoas indo e vindo sem destino. Casas em constantes mudanças. Cenário em eterna metamorfose. E quem ousa, na correria do dia-a-dia, parar por um momento e observar estas mudanças singelas? Que segredos guardam os blocos do pavimento da rua em você passa todo dia para ir trabalhar?

Já parou para olhar para uma casa e imaginar as centenas de historias que ocorreram dentro daquelas paredes? Que tipo de loucura seus moradores ousam deixar encarcerado dentro do conforto do lar? Ah, queridos amigos, nem tentem forçar a mente. É na invasão da escuridão da noite que os demônios acorrentados na carne humana ousam se libertar.

O mundo de hoje vai esvaindo em fumaça, enquanto vejo a arquitetura de uma cidade antiga se formando na minha frente. Os homens vivos vão sumindo, deixando somente lembranças de homens que já viveram. Alguns fantasmas, como eu, se debruçam a chorar quando olham o que, um dia, foram seus corpos vivos. Uma breves antiga se forma, tão real quanto a que eu conhecia em vida.

Surjo dentro de uma casa, levado por uma força oculta que ainda não entendo. Olho pela janela e vejo várias casas populares de madeira. No fim do horizonte há uma grande castanheira. Eu a conheço, como a conheço. Era a castanheira que ficava nos aposentos da Escola Rossilda Ferreira.

Tudo está diferente. Rua de terra batida, crianças livres, correndo na rua. Algumas vinham molhadas do igarapé do Santa Cruz. Eram tempos difíceis, mas com uma liberdade gostosa que, quando vivo, pouco degustávamos.

Uma das crianças entra na casa onde eu estava. Vejo ela correndo para a cozinha e meus olhos encontram um calendário na parede. Estava revivendo o ano de 1983, período do governo do Gervásio Bandeira. O sitio que existia aqui antes foi indenizado e criado casas populares. O que explica as casas semelhantes e enfileiradas da minha visão.

Vou até a cozinha. O garoto está tomando um café com pão e margarina. Mesmo não tendo corpo, fiquei com vontade de poder consumir aquele alimento. Saborear uma comida... Algo que só percebi ser prazeroso depois que morri. Tantas coisas simples e gostosas, mas acabamos deixando passar por acreditar que há coisas mais importantes. Mas a morte nos ensina que nada é importante.

- Espoca-rabo, vem aqui fora um instantinho. – gritou alguém na rua.

O garoto largou o café com pão e saiu correndo, de pés descalços. Atravessei a parede e fui ver a conversa dos garotos, mas antes que eu pudesse ouvir algo eles saíram correndo. Deixei o vento me levar em direção a eles.

Se encontraram com outros garotos, que estavam amontoados embaixo de uma árvore. Quando me aproximei vi que eles estavam segurando um cachorro. O garoto, que chamaram de espoca-rabo, se aproximou tirando algo do bolso. Era o que chamavam de bomba de 30. Amarrou no rabo do cachorro e acendeu com um fosforo. Soltaram o animal que saiu correndo desesperado. Em segundos a bombinha explodiu, fazendo voar sangue e pedaços do animal.

O grito do cachorro se juntou aos risos das crianças. Mas aquele garoto não estava rindo. Ele olhava para o cachorro em sofrimento com um olhar diferente dos demais. Me aproximei e, como se a força que desconheço soubesse de meus anseios, deixou o tempo lento. Era simples, quase imperceptível, mas aquele garoto sorria de uma forma sádica, cruel. Ele sentia um prazer incomum no que havia feito.

Eles evaporaram. Tudo evaporou. Me vi em um limbo escuro. Uma pequena luz surgiu, ao longe. Seria a luz que a Morte tanto anseia que eu siga? Tentei arriscar. Caminhei lentamente e uma porta foi surgindo. Fiquei receoso de abri-la, mas olhei em volta e vi que não havia outro caminho.

A porta rangeu, mas as pessoas que estavam dentro não ouviram. Eram dois adolescentes. Um eu reconheci, era o espoca-rabo. O outro eu desconhecia. Não foi essa passada de tempo, da infância a adolescência, que me chamou atenção, mas a cena que se estendia em minha frente.

Havia um tapete vermelho aos meus pés. Um tapete de sangue. Em alguns pontos havia pedaços de carne, tripas, dedos. Espoca-rabo estava debruçado sobre o corpo de um de seus amigos, esquartejando-o. Os mesmos olhos que brilhavam ao maltratar aquele cachorro, agora brilhavam ao matar um homem.

Tudo escureceu. Em minha frente apareceu espoca-rabo puxando o corpo do rapaz dentro de uma grande sacola. Ao longe eu vi a castanheira, iluminada pela lua.

Com uma pá o espoca-rabo começou a cavar aos pés daquela árvore. Me abaixei para ver o quão profundo ele cavava, e com uma maestria incomum.

Uma mão surgiu nas terras que ele mexia, não havia sido o primeiro que ele havia matado. Ele jogou o saco no buraco e pôs-se a encher de terra. E antes que o sol surgisse e as pessoas acordassem, ele já estava em sua rede em um sono profundo.

A escuridão tomou conta de meus olhos novamente. Fiquei horas sem ver nada, sentir nada, ouvir nada. Somente com os meus pensamentos sobre o que eu havia testemunhado. Um forte clarão surgiu em meus olhos e me vi na Breves que morri. Em minha frente lá estava ela, a castanheira. Grande, vigorosa, bela. A Morte estava sentada em sua sombra, me observando, afiando a sua foice. Carros e motos passavam ferozmente, atravessando-me sem nem imaginar minha presença. Ninguém parava para olhar para aquela árvore e se questionar o porquê ela superou o tempo com todo aquele vigor.

Mas eu sabia a resposta. Somente eu e a morte sabíamos que aquela árvore, nessas décadas que se passaram, usou corpo humano como adubo. Corpos esquartejados que irão permanecer incógnitos pelos séculos que se perpetuarão.

Fim

segunda-feira, 21 de março de 2016

Tragédia grega

“Ela repousou no banco assim como o sol repousa no horizonte. Quem é ela? Desconheço. Mas se uma voz sussurrasse em meu ouvido dizendo ser ela ascendente das antigas ninfas que encantavam os gregos, eu acreditaria sem pestanejar. Ela agarrou-se a feminilidade, sem deixar de emanar sua maturidade. Uma mulher que, sem nem ao menos falar, se sobressai a muitas. Me prendeu a atenção e furtou meu raciocínio. Ladra! Deixou o meu coração em cárcere privado. Ah, se ela soubesse que gostaria de pagar o resgate com a minha liberdade! Viver preso a ela, assim como as estrelas e o universo. Me contentaria que, pelo menos, ela tirasse aqueles olhos do livro e lhes voltassem para mim, abrindo o sorriso que me deixou abobado. Nossa, iria ser um atentado! Seria a próxima manchete dos jornais: Morto mais um homem apaixonado. Seria trágico, mas morreria feliz. Afinal, de uma ninfa não se pode esperar menos do que uma tragédia grega. A nossa tormenta é a diversão é dos deuses antigos.”

Renan Medeiros, o Coruja.
Confissões Testosterônicas.
Breves, 21 de março de 2016

domingo, 21 de fevereiro de 2016

E, enfim, desiste...

“Até um homem apaixonado pode desistir de amar. Mesmo que esse amor seja verdadeiro, único e intenso, chega um momento que diante de tantos “nãos” ele acaba desistindo. Soterram seu coração em uma avalanche de desprezo e dor, que acabam destruindo este sentimento sublime. E como pedir para um homem que só conheceu a dor do amor a amar novamente? Há mulheres mais cruéis que muitos homens por ai. Nadam na hipocrisia do discurso, pregando a crença de que procuram um amor verdadeiro, que lhe queiram bem. Mas, no fim, somente aceitam aqueles homens que possam lhe dar estabilidade financeira e status social. E aquele amor, para elas, torna-se descartável. Para vós, homens, que passaram por esse desprezo cruel, não se intimidem com o acaso do destino. Não trancafies este sentimento no calabouço de seu coração, acusando-o de seu sofrimento. A culpa é desse pensamento torpe de mulheres que cresceram desconhecendo o sabor doce do néctar de amar. E mulheres assim não merecem nem receber, entre suas pernas, nosso genes em forma de gozo”

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Na bad

“Nunca imaginei vê-la assim, tão abatida. Uma mulher que outrora transbordava felicidade e alegria, agora transitava em estradas angustiantes e depressivas. Um caminhar pausado, automático, sem energia. Era uma ave de belo canto, que teve seu cantarolar poético decepado pelos acasos cruéis da vida a dois. “O que vou fazer de minha vida agora?”, ela me perguntou.  Seu rosto salientava a pulsação dos pensamentos negativos e perdidos em sua mente. Que cena angustiante. Fugia-me o raciocínio a ver tão bela criatura sofrendo pelo abandono cruel de um homem que nunca a amou. “Ele me trocou por outra”, completava. E eu pensava nessas palavras... “Me trocou...” “Me trocou...” Ditas como se ela fosse um mero objeto, descartado por alguém por não mais lhe querer. Deixado de lado após o grande e intenso uso, para poder dar espaço para um novo modelo; mais “atraente”, “novo”, “da moda”. Que loucura toda é essa? O pior de tudo é ver, através de seu olhar, a plena certeza de que ela acredita de sido usada. E foi. Seu corpo foi empregado para sanar os desejos sexuais de um homem, e sua inteligência e força foram focados para ajudá-lo a crescer profissionalmente. E depois de usá-la como escada, ele a descartou. Não há como escapar desses termos “trocar” e “descartar”, que “coisificam” a mulher, pois foi isso mesmo que ocorreu. Ele a usou. A olhava somente como um objeto, que com o uso caiu em desuso e procurou um novo brinquedo para se divertir. Ela me perguntava o que fazer, e não podia dizer outra coisa: Volte a ser mulher. Sim, isso mesmo. Seja o que você nasceu para ser: MULHER. Estude, trabalhe, cuide de sua saúde, de seu corpo, de sua mente e de sua alma. Sempre achei incrível a capacidade da mulher de se recuperar, remodelar, reestruturar. Sim, elas se afundam em uma depressão, se acorrentam na “bad”, se perdem na angustia. Mas elas retornam, mais fortes, maduras e belas. E esta mulher é mais uma dessas. Que mesmo com a incompetência masculina que lhe envolveu em um roteiro de desprezo, ela retornará com a certeza de que se libertou de um cárcere invisível de um amor ilusório. Só lamento que muitas ainda vivem dentro deste presidio emocional. Mas, um caso de cada vez”

Renan Medeiros, o Coruja
Confissões Testosterônicas
Breves, 16 de fevereiro de 2016

sábado, 13 de fevereiro de 2016

O que vi no carnaval de Breves

Sentei em uma poltrona que já me conhece o suficiente para adaptar suas almofadas de acordo com os devaneios e reflexões que tenho como escritor. Ela é confortável, e abraça-me com a sua singularidade e encanto, assim como as imagens de carnaval abraçam minha retina, inundando minhas madrugadas de questionamentos e, no geral, quase sem nenhuma resposta.
Eu vi.
Vi o homem solteiro estampar o seu melhor sorriso, com um bom gingado e olhar como adorno, para encantar a visão e instigar o interesse das mulheres que adentram ao mundo da devassidão e boemia chamado ‘carnaval’. É um jogo de risco, que muitas vezes riscam o chão da Avenida rio Branco com dobradas de rostos, para escapar das investidas do solteiro. Outras vezes o risco fica na face do solteiro, marcas de batom de mais um número para a sua conquista quantitativa.
Encontrei o casal de namorado que mergulham nos hormônios do momento e se esquecem dos compromissos implícitos da relação. Adentram caminhos diferentes para se jogarem em braços de homens e mulheres estranhos, que desconhecem a pessoa ficante; vendo somente um pedaço de carne, embalado em um abadá, sacudindo no açougue de um bloco de rua. Será Friboi?
Achei os casados, nadando contra a maré carnavalesca e mostrando que, sim, há como comemorar o carnaval como casal. Vi namorados que beijaram o respeito mutuo e pularam na folia sem chafurdar na lama do desrespeito. Lindas visões que abrilhantaram esses dias de comemoração.
Infelizmente, não superaram as imagens das traições e do abuso do álcool. A juventude se jogando de cabeça na água rasa do alcoolismo e desvairando nas ondas da libido, esquecendo-se do compromisso que aceitou ao pedir/aceitar determinado relacionamento dito sério.
Entristeço-me ao saber que a imagem da violência e criminalidade pediram passagem para o arco da apoteose. Seu abre alas chegou arrasando o carnaval de muitos foliões que estavam lá, somente para curtir. Ainda vejo, ao fechar o olho, o adolescente algemado, sendo levado para as autoridades, enquanto a mulher assaltada lhe batia com a sua sapatilha.
Imagens que surgem na cabeça, que tento diluir no esquecimento para dar espaço aos sorrisos felizes e olhos brilhantes das crianças. Tantas que foram, muitos nos colos dos pais, fantasiados dos mais variados personagens, ensinando a tantos adultos, velha guarda da folia, o verdadeiro sentido de comemorarmos esse feriado nacional: a paz, o amor, a liberdade e o encantamento.
Pergunto-me: o que tantas imagens que presenciei no carnaval têm a me ensinar? Aprendi que muitas pessoas possuem uma visão diferente do carnaval. Uns aproveitam esta comemoração como desculpa para mergulhar no álcool, outros para aproveitar a baixa da guarda dos homens e mulheres e conseguirem um amor de carnaval. Alguns acham que esse período é ótimo para se conseguir dinheiro fácil, enquanto alguns aproveitam a oportunidade para levar seus filhos para uma festa divina.
Carnaval é amor nacional, mesmo que muitos o critiquem. É feriado, tempo de comemorar seja lá o que for. Período de festejar ou relaxar. Afinal, se até o amor tira férias nesses dias, por que hei de perder a oportunidade?
E que venha mais carnavais!

Renan Medeiros, o Coruja
Canto do Coruja
renanmedeiro_costa@yahoo.com.br

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

Nan

“Gosto quando ela me chama de ‘Nan’. Tantas pessoas assim já me chamaram, com carinho, paixão, amor, amizade. Mas ela... Ah! Ela é especial. Não sei se é por causa desse sorriso, ou esses olhos brilhantes de garota apaixonada. Pode ser que seja a felicidade de ambos ao se verem, ou todo o carinho que vem seguindo essa singela abreviação. Mas quando essas três letrinhas saem daqueles lábios, meu coração se derrete. A pior coisa é homem apaixonado. Fica besta, agoniado e até uma palavrinha, tão comum aos ouvidos, quando dita por ela se torna as mais belas sinfonia de amor. E como adoro dançar esse amor!”

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Penso em amanhã

“Penso em amanhã. Vou ter que enfrentar ela. Sabe, a vida é algo tão simples, mas nós complicamos. Quando digo “nós” não estou dizendo “eu complico minha vida”, mas sim “nós complicamos a vida um do outro”. Afinal, quando alguém está conseguindo viver a vida dele numa boa, sempre tem um “coisinha”, uma beltrana, que chega e embaraça nossa situação. Viver era pra ser simples, mas inventaram a vida em sociedade. Nunca achei que teria o amor dela, e a insistência e perseverança me fez tê-la. Minha vida estava navegando em águas pacificas, até que uma moça surgiu no trabalho. De tantos homens lá que se interessaram, ela acabou vindo se engraçar comigo. E não tinha como não nota-la. Veio as aproximações, e de mim os afastamentos. Dizia para ela que tinha namorada e a amava. Mas estas palavras só a deixavam mais teimosa. Chegou um momento que não resisti aquele corpo, e cedi ao instintos mais primitivos do meu ser. Era só sexo, tanto que após o ato me retirei sem lhe dizer uma só palavra. Minha consciência e responsabilidade estão pesando em meu coração, e decidi que amanhã irei contar a minha namorada. Sei que não serei perdoado e que a perderei. Mas prefiro ser um homem sincero e verdadeiro com meus erros sem o amor, do que amar sabendo que fui infiel com aquela pessoa que abriu sua vida e seu coração à mim. Isso é ser homem.”

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Na delegacia...

- Bom dia, seu guarda.
- Bom dia, cidadão.
- Gostaria de saber do meu caso. Se já tem alguma noticia?
- Desculpe, senhor. Há muitos casos que estamos investigando. Poderia ser mais especifico?
- Meu nome é Renan Medeiros, tive meu notebook roubado semana passada.
- Ah sim. Fale com o Rogerio. Ele está naquela mesa lá, oh. Aquele de bigode.
***
- Você é o Rogerio.
- Sim.
- Meu nome é Renan. Gostaria de saber se têm notícias do meu notebook que foi roubado semana passada.
- Ah, sim. Temos notícias sim.
- Que maravilha!
- Primeiramente, ele não foi roubado.
- Pera. Como assim?
- Ele se mudou pra São Paulo.
- Estou falando de um notebook, senhor.
- Sim, eu sei.
- Tá me dizendo que ele se MUDOU pra São Paulo?
- Exatamente. Nossas investigações mostraram que a bateria dele se viciou, acabou se enrolando com traficantes da CELPA e fugiu pra São Paulo. Você pode encontrar ele na Crakolância. Mas ele está irreconhecivel. Ele fez umas tatuagens em sua carcaça, vendu algumas peças de si e tá usando energia de gato em plena luz do dia.
- Jesus!
- Notificamos uma ong de técnicos que reabilita esses viciados. Mas parece que seu notebook é mais problemático do que pensávamos. Sabe como é... quando um Sony Vaio dá pau, é foda.
- Obrigado.
- Qualquer coisa te avisamos.
- Até mais.
- Até.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

Jhon WalkCat na Torre dos Gementes / Parte 1 – Seja bem vindo, Jhon WalkCat

Havia dois guardas o levando até a cela, cada um o sustentando por um dos braços. Havia apanhado tanto que já não tinha mais forças para caminhar. O corredor negro, assim conhecido devido as pedras negras a qual fora construída, estava sendo marcado pelo sangue do Jhon WalkCat, que gotejava pela fissura de sua boca – proveniente de um soco das mãos de ferro do guarda Godeye, o que tudo vê.
O portão da cela foi aberto, os guardas o colocaram e saíram, conversando sobre o leitão assado que os esperava para a comemoração pela prisão do ladrão mais procurado da província. O mesmo que acabaram de trancafiar na Torre dos Gementes.
- Onde estou? – perguntou-se Jhon, muitas horas depois de ter sido preso. – Onde estou?
Abriu os olhos e viu que estava pendurado, preso por uma pulseira de ferro e correntes no teto. Seu corpo balançava dentro da sala negra, que era iluminado por uma pequena janela gradeada. Seus braços doíam, seu corpo gemia de agonia.
- TÊM ALGUEM AI?! – gritou.
- Não adianta gritar, camarada. – disse uma voz.
- Quem está falando? – perguntou.
- Antigamente me chamavam de Sentinela. Mas hoje em dia isso não mais importa.
- Onde você está?
- Na cela ao lado.
- Cela? – lembrou-se do que havia acontecido. – Sim, eu fui preso. Mas que lugar é esse? Onde estou?
- No inferno, camarada.
- Impossível.
- Por quê?
- Eu já vim de lá.
- Você é um cara engraçado. Bom... Você está na Torre dos Gementes, amigo. A torre construída especialmente para os criminosos mais perigosos da província. Bom, pelo menos é o que dizem.
- Torre dos Gementes? Não acredito. Não acredito. A prisão sem lei.
- Sim, exatamente. A torre mais alta, a prisão mais profunda, os guardas mais cruéis. Onde o tormento é eterno e a fuga uma ilusão.
- Que inferno!
- Como você está preso, amigo?
- Há pulseiras de ferro em meu pulso, presos em uma corrente no teto. Estou pendurado, balançando.
- Que sorte.
- Como sorte?
- Estou deitado em uma cama de madeira, completamente nu. Meus braços, pernas e pau estão pregados na madeira com pregos de aço.
- Que crime cometeu?
- Estupro... de crianças.
- Aaahh... agora me lembro. Sentinela, o maníaco. Eras um dos guardas pessoais do rei. Foi descoberto quando se engraçou com uma garota, mas não sabia que ela era filha do príncipe Garden, o belo, convidados para o casamento da princesa Sophia. Você foi pego há meses.
- E há meses estou nessas condições. Toda noite eles vêm e me açoitam com chicotes com pontas de metal. E toda manhã mandam curandeiras, das mais sábias, para tratarem dos meus ferimentos. Caso assim não fosse, eu já teria morrido. Seria uma benção.
- O que será que vão fazer comigo?
- Espere o pior... e será pouco.
Os dois pararam de conversar, e o silencio trouxe a tona o motivo que batizou aquela torre de ‘Torre dos Gementes’. Gritos de desesperos, gemidos, uivos de dor, ecoavam por todo o canto, de todo o lugar. Presidiários torturados toda manhã, tarde e noite, ansiando pelo beijo do anjo da morte.
A luz fraca que vinha da janela foi dando espaço para a escuridão da noite, e logo sua sala ficou tão negro quanto o inferno. Ouviu um portão se abrindo e fechando, algumas vozes falando coisas sem sentido, e os barulhos do chicote descendo em carne nua, seguidos de gritos do Sentinela.
Não demorou muito e o seu portão abriu, entrando dois guardas com tochas. Logo veio outro, era o próprio Goldeye, que vinha empurrando um carrinho de ferro com brasa. Ele sorriu para o WalkCat, mostrando seus dentes podres, e com a sua mão de ferro lhe socou o estomago.
Seu gemido de dor se juntou ao som das chicotadas da outra cela, que já não se ouvia mais gritos do Sentinela – haveria morrido ou desmaiado? Ele se contorceu, faltou-lhe o ar. Mas logo conseguiu voltar a respirar normalmente.
- Jhon WalkCat. Bem vindo a Torre dos Gementes. – disse Godeye.
- Acredito que já tenha recebido suas saudações quando entrei aqui. Há este corte em minha boca, devido ao seu soco, para provar isso. Ah, e lhe parabenizo. A força de seu soco deixou-me desmemoriado por um tempo. Bom, se já me deste as saudações na entrada, então não vejo motivos para a sua visita. Então, peço que se retirem, pois preciso dormir.
Outro soco no estomago, mais forte.
- Realmente seu soco é forte. – disse Jhon, após voltar a respirar novamente.
- Agradeça aos ferreiros do norte. – disse mostrando sua mão de ferro. – Nunca imaginei que eles teriam a capacidade de fazer tamanha proeza.
- Não é todo dia que alguém ganha um braço novo. Mas, me responda uma coisa. Por toda a província entoam a canção de como tu perdeste o braço. Você era, assim como o Sentinela, um guarda pessoal do rei. Mas perdeu o braço para uma mulher, em luta singular, após ser desonrado por ela. – Jhon riu. – O rei, ao descobrir, deu-lhe esse braço novo de presente pelos seus... “serviços prestados”... e o transferiu para esse buraco. Um bom lugar para um homem que apanha de mulher. Afinal, todos nós estamos presos e não podemos nos defender.
Outro soco.
- Pelo visto tu falas muito. Quem sabe, qualquer dia desses, eu tenha a honra de cortar fora a sua língua. Mas hoje, a pedido do rei, faremos algo diferente. - Godeye virou as costas para o ladrão e enfiou a sua mão de ferro dentro da brasa. Remexeu lá até achar algo. – O rei se solidarizou com você. Não é todo dia que um homem tenta roubar a coroa do rei da província Summermoon. E, como presente por sua coragem, o rei lhe enviou uma replica de sua coroa, feita de ferro.
Ele tirou a coroa, que estava laranja de tão quente. Dava a sensação de que, se continuasse na brasa por mais alguns minutos, começaria a derreter. Se aproximou do Jhon, um dos guardas pôs uma pequena escada, subiu e, mesmo com a tentativa de WalkCat, colocou a coroa quente em sua cabeça.
Desceu da escada, e saiu empurrando o carrinho de brasa, enquanto os guardas saiam e fechavam a porta, deixando Jhon WakCat pendurado por correntes, se contorcendo de dor e gritando pela queimadura que a coroa de fogo lhe fazia na cabeça.

***

Renan Medeiros, o Coruja

Contratos quebrados.

Absorto, ele fixava sua visão no teto enquanto sentia os delicados dedos dela tateando seu tórax, deleitando-se com os resquícios de prazer ...