Estava naqueles dias onde os olhos vagueiam pela vida em busca de algo, sem necessariamente saber o que é este algo que tanto o coração de escritor procura. Um objeto, um acontecimento, uma cena inusitada, o voo de um pássaro, ou o simples caminhar de um casal de namorados. Sem compromissos ou imposições, um simples passeio ocular em torno de tudo, mas sem se atentar a nada. Nutrindo-me com tudo em minha volta, cada espetáculo particular da vida alheia registradas em fotografias cerebrais de um simples homem com um lápis e papel em mãos. Mas nada, ainda, havia me retirado da zona de conforto a ponto de abolir meu passeio visual em inquietações literárias e por minhas mãos em uma alergia enérgica capaz de me fazer escrever. Nada, até vê-la. Uma simples mulher, ao longe, sentada em uma cadeira de plástico, debruçado sobre a mesa e com uma caneca com café em mãos. Seus cabelos negros debruçavam, levemente, sobre o olho direito, enquanto lia algum livro que estava repousando sobre aquela mesa. A caneca de café extinguia seu doce cheiro em leves fumaças esbranquiçadas, que saiam dançando aos braços do galanteador vento de julho. Seus olhos faziam o movimento de ir e vir, acompanhando as palavras do livro, que se organizavam em linhas e parágrafos e formavam uma historia capaz de prender a atenção daquela doce garota. Mas, no fundo, algo não estava certo. Seu olhar, mesmo atendo ao universo escrito por um autor que desconheço, se perdia. Era segundos, mas perceptíveis. Como se, em certos momentos, ela fosse resgatada à realidade por alguma acusação de seu cérebro, ou pelas labaredas de lembranças pelas quais ela queria esquecer. Um café e um livro, sendo utilizados para resgatar um pouco da sanidade daquela moça, que se perdia em algum problema enigmático para mim. Mas nem a cafeína, nem as brincadeiras literárias daquele livro, eram capazes de tirar aquela jovem de suas angustias. Ela levantou o olhar, fitou o céu como se desejasse ser levada por alguma força desconhecida, e suspirou. Fechou o livro, bebeu o ultimo gole no café, deixou o dinheiro 2016 na mesa e se retirou, desfilando sua beleza pelas calçadas da praça; sem ser notada por ninguém, exceto por um escritor que talvez ela nunca tenha ouvido falar (e quem sabe nunca ouvirá).
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