Havia dois guardas o levando até a cela, cada um o sustentando por um dos braços. Havia apanhado tanto que já não tinha mais forças para caminhar. O corredor negro, assim conhecido devido as pedras negras a qual fora construída, estava sendo marcado pelo sangue do Jhon WalkCat, que gotejava pela fissura de sua boca – proveniente de um soco das mãos de ferro do guarda Godeye, o que tudo vê.
O portão da cela foi aberto, os guardas o colocaram e saíram, conversando sobre o leitão assado que os esperava para a comemoração pela prisão do ladrão mais procurado da província. O mesmo que acabaram de trancafiar na Torre dos Gementes.
- Onde estou? – perguntou-se Jhon, muitas horas depois de ter sido preso. – Onde estou?
Abriu os olhos e viu que estava pendurado, preso por uma pulseira de ferro e correntes no teto. Seu corpo balançava dentro da sala negra, que era iluminado por uma pequena janela gradeada. Seus braços doíam, seu corpo gemia de agonia.
- TÊM ALGUEM AI?! – gritou.
- Não adianta gritar, camarada. – disse uma voz.
- Quem está falando? – perguntou.
- Antigamente me chamavam de Sentinela. Mas hoje em dia isso não mais importa.
- Onde você está?
- Na cela ao lado.
- Cela? – lembrou-se do que havia acontecido. – Sim, eu fui preso. Mas que lugar é esse? Onde estou?
- No inferno, camarada.
- Impossível.
- Por quê?
- Eu já vim de lá.
- Você é um cara engraçado. Bom... Você está na Torre dos Gementes, amigo. A torre construída especialmente para os criminosos mais perigosos da província. Bom, pelo menos é o que dizem.
- Torre dos Gementes? Não acredito. Não acredito. A prisão sem lei.
- Sim, exatamente. A torre mais alta, a prisão mais profunda, os guardas mais cruéis. Onde o tormento é eterno e a fuga uma ilusão.
- Que inferno!
- Como você está preso, amigo?
- Há pulseiras de ferro em meu pulso, presos em uma corrente no teto. Estou pendurado, balançando.
- Que sorte.
- Como sorte?
- Estou deitado em uma cama de madeira, completamente nu. Meus braços, pernas e pau estão pregados na madeira com pregos de aço.
- Que crime cometeu?
- Estupro... de crianças.
- Aaahh... agora me lembro. Sentinela, o maníaco. Eras um dos guardas pessoais do rei. Foi descoberto quando se engraçou com uma garota, mas não sabia que ela era filha do príncipe Garden, o belo, convidados para o casamento da princesa Sophia. Você foi pego há meses.
- E há meses estou nessas condições. Toda noite eles vêm e me açoitam com chicotes com pontas de metal. E toda manhã mandam curandeiras, das mais sábias, para tratarem dos meus ferimentos. Caso assim não fosse, eu já teria morrido. Seria uma benção.
- O que será que vão fazer comigo?
- Espere o pior... e será pouco.
Os dois pararam de conversar, e o silencio trouxe a tona o motivo que batizou aquela torre de ‘Torre dos Gementes’. Gritos de desesperos, gemidos, uivos de dor, ecoavam por todo o canto, de todo o lugar. Presidiários torturados toda manhã, tarde e noite, ansiando pelo beijo do anjo da morte.
A luz fraca que vinha da janela foi dando espaço para a escuridão da noite, e logo sua sala ficou tão negro quanto o inferno. Ouviu um portão se abrindo e fechando, algumas vozes falando coisas sem sentido, e os barulhos do chicote descendo em carne nua, seguidos de gritos do Sentinela.
Não demorou muito e o seu portão abriu, entrando dois guardas com tochas. Logo veio outro, era o próprio Goldeye, que vinha empurrando um carrinho de ferro com brasa. Ele sorriu para o WalkCat, mostrando seus dentes podres, e com a sua mão de ferro lhe socou o estomago.
Seu gemido de dor se juntou ao som das chicotadas da outra cela, que já não se ouvia mais gritos do Sentinela – haveria morrido ou desmaiado? Ele se contorceu, faltou-lhe o ar. Mas logo conseguiu voltar a respirar normalmente.
- Jhon WalkCat. Bem vindo a Torre dos Gementes. – disse Godeye.
- Acredito que já tenha recebido suas saudações quando entrei aqui. Há este corte em minha boca, devido ao seu soco, para provar isso. Ah, e lhe parabenizo. A força de seu soco deixou-me desmemoriado por um tempo. Bom, se já me deste as saudações na entrada, então não vejo motivos para a sua visita. Então, peço que se retirem, pois preciso dormir.
Outro soco no estomago, mais forte.
- Realmente seu soco é forte. – disse Jhon, após voltar a respirar novamente.
- Agradeça aos ferreiros do norte. – disse mostrando sua mão de ferro. – Nunca imaginei que eles teriam a capacidade de fazer tamanha proeza.
- Não é todo dia que alguém ganha um braço novo. Mas, me responda uma coisa. Por toda a província entoam a canção de como tu perdeste o braço. Você era, assim como o Sentinela, um guarda pessoal do rei. Mas perdeu o braço para uma mulher, em luta singular, após ser desonrado por ela. – Jhon riu. – O rei, ao descobrir, deu-lhe esse braço novo de presente pelos seus... “serviços prestados”... e o transferiu para esse buraco. Um bom lugar para um homem que apanha de mulher. Afinal, todos nós estamos presos e não podemos nos defender.
Outro soco.
- Pelo visto tu falas muito. Quem sabe, qualquer dia desses, eu tenha a honra de cortar fora a sua língua. Mas hoje, a pedido do rei, faremos algo diferente. - Godeye virou as costas para o ladrão e enfiou a sua mão de ferro dentro da brasa. Remexeu lá até achar algo. – O rei se solidarizou com você. Não é todo dia que um homem tenta roubar a coroa do rei da província Summermoon. E, como presente por sua coragem, o rei lhe enviou uma replica de sua coroa, feita de ferro.
Ele tirou a coroa, que estava laranja de tão quente. Dava a sensação de que, se continuasse na brasa por mais alguns minutos, começaria a derreter. Se aproximou do Jhon, um dos guardas pôs uma pequena escada, subiu e, mesmo com a tentativa de WalkCat, colocou a coroa quente em sua cabeça.
Desceu da escada, e saiu empurrando o carrinho de brasa, enquanto os guardas saiam e fechavam a porta, deixando Jhon WakCat pendurado por correntes, se contorcendo de dor e gritando pela queimadura que a coroa de fogo lhe fazia na cabeça.
***
Renan Medeiros, o Coruja
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