terça-feira, 23 de maio de 2017

Mãos Dadas


Essa noite eu a vi na rua de mãos dadas com um estranho. Não tenho certeza se ela me viu, ou não. Queria que ela tivesse me visto, sentido que nem a distância e aquela visão possuem a capacidade de tirar de mim o amor que lhe sinto. Um sentimento tão bem nutrido é difícil não crescer, se espalhar, germinar. Querer que eu deixe de amá-la é como pedir que eu mate um pedaço de mim, como se solicitasse que suicidasse um pedaço de minha alma. Não sou sadomasoquista, apesar de saber que te amar é me permitir sofrer. Como saber qual o caminho certo se a razão e emoção me chamam em direções completamente opostas? A liberdade que dou pra minha mente me submete a conclusões tão profundas e distintas, que me acomete a indecisão do que fazer com essa paixão. Será que você e esse cara estão juntos, felizes, firmes? Você me esqueceu? Aquele sentimento acabou? Tenho que nutrir esperanças de tê-la novamente em meus braços? Será que, um dia, estaremos novamente andando de mãos dadas por ai? Pensamentos, mil pensamentos, milhões de sonhos e caminhos. Nada é certo ou incerto, somente a certeza de que neste momento há um abismo entre nós e que suas mãos estão acolhidas por outro.

Um Dia em Breves


Credinanderson resolveu sair à noite, curtir, se divertir, aproveitar a juventude, lacrar, detonar. Mas queria fazer algo diferente do que estava acostumado. Pegou sua motoca e saiu pelas ruas da cidade de Breves. Em menos de quinze minutos já tinha percorrido todos os lugares movimentados da cidade.

 

Queria pegar um cinema, ver uma apresentação teatral, talvez ouvir uma orquestrar, assistir a uma ópera, ver um show instrumental, contemplar algumas obras de arte, rir em um show de humor... Mas não havia nada disso por ali. Então, sem opções, se juntou com uns amigos e foram para um show rotineiro de uma dessas casas com as mesmas músicas que ouve todo dia. Encheu a cara para se animar e preencher o vazio que aquela cidade proporcionava.

 

Chegou em sua casa e nem pôde ir dormir, pois a sua caixa d’água estava vazia e ele tinha que ligar a bomba e ficar puxando a água com a boca para ver se conseguia alguma coisa. Depois de duas horas batalhando, nada. Seria mais um dia sem água para se banhar, lavar a louça e limpar a casa.

 

Sujo, de ressaca, cansado e se lembrando que seu ventilador havia queimado devido as quedas de luz continua na cidade, resolveu ir para um igarapé se refrescar e se espertar – e aproveitar para tirar um pouco a catinga do corpo.

 

Pegou sua motoca e partiu para a estrada, rezando para que o dtran não tivesse fazendo nenhuma blitz, pois ele havia usado o dinheiro do IPVA para comprar alguns remédios para a sua mãe, pois os mesmos estavam em falta no posto de saúde do bairro dela.

 

No caminho pro balneário ele teve que desacelerar por causa dos buracos que havia no asfalto, e nem viu quando um cara saiu do matagal e acertou a testa dele com um pedaço de pau. Depois de algum tempo jogado no chão, inconsciente, apareceu uma viva alma que o viu sangrando e chamou os bombeiros. Demoraram, devido às péssimas condições da estrada, mas chegaram e o levaram para o hospital municipal.

 

Lá ele foi atendido, medicado e constatado uma fratura em seu crânio. Regularam para o regional, o qual só foi aceito no dia seguinte. No regional começou a apresentar convulsões e descobriu que a partir daquele dia teria que tomar carbamazepina pro resto da vida.

 

Recebeu alta e foi para sua casa, chegando lá viu que haviam invadido o lugar e roubado tudo que ele tinha, inclusive o ventilador queimado. Esvaziaram a geladeira e até defecaram no corredor.

 

Desesperado e deprimido, Credinanderson amarrou uma corda na cozinha e se enforcou. Seu corpo foi encontrado dois meses depois, quando a policia foi bater na casa dele em busca da mesada atrasada da sua filha com a Juscréia.

 

No dia seguinte estavam falando que Credinanderson havia se matado por ter levado um chifre da namorada.

domingo, 14 de maio de 2017

Confissões de Gabe (Um livro em produção)


Dia 04 de Janeiro – Aniversário do primo que não lembro o nome.

 

         Hoje tive que ir até a casa de uma tia para almoçar, em comemoração ao aniversario do décimo quarto filho dela. Nem lembro quantos anos o meu primo estava fazendo. Eu nem lembro o nome dele, para falar a verdade. A titia fez tanta questão de por uma penca de gente no mundo que acaba ficando difícil lembrar o nome de todos.

         Ela é dessas mulheres que gostam de colocar o nome dos filhos parecidos. Daquele jeito que faz todo mundo se confundir. É uma confusão da peste. E tenho certeza que irá me perdoar por não saber o nome do primo aniversariante.

Lenilde, Lenilda, Lenilton, Lenilsivan, Lenilson, Lenilta, Lenisilcleide, Lenilsileida, Leniscleia, Lenisilcleiton, Lenilsiléia, Lenisvaldo, Lenisvandro e Lenisluce.

         Duvido alguém ler esses nomes bem rápido.

         Pois bem, tive que ir, então, até essa reunião familiar para dar os parabéns a um dos meus primos que deve sofrer bulling na escola, devido ao nome, digamos, exótico. Fui até uma loja e comprei um brinquedo que achei que o fulano iria gostar. Afinal, ele era o mais novo, ainda criança, então não havia necessidade de comprar um presente mais elaborado.

         Fiquei na varanda da minha casa olhando o horizonte. Vi quando o sol sumiu atrás dos prédios e a noite cair trazendo um céu estrelado e uma lua cheia cativante. Noite maravilhosa para fazer um coito na minha namorada, pena que tinha que ir até o abatedouro emocional familiar e encarar todo aquele povo.

         Então, com a chegada da noite, e o horário do jantar se aproximando, peguei meu carro e partir rumo à casa da minha tia, que ficava a poucos minutos de distancia. Ao me aproximar no local já pude sentir o clima familiar voando no ar, como o cheiro de um lixão a céu aberto.

         Então fechei a janela do carro.

***

         A casa da minha tia era antiga, um clássico da arquitetura gótica. Exalava todo o ar de riqueza que seu marido conquistou durante os anos. Estacionei o meu carro um quarteirão antes de chegar lá. Fiquei observando a imponência daquela residência e pensando o quanto me sentia pequeno diante de tanto luxo.

         Desci do carro e fui a pé até a casa da titia. Ao me aproximar, a lentos passos, já fui começando a ouvir o arrocha tocando dentro da casa. Essa era a minha tia. Havia conseguido enriquecer, mas não deixava de lado a sua origem brega.

         Após tocar a campainha um dos fulanos abriu a porta. Sorriu para mim, mostrando cordialidade e felicidade por me ver. Infelizmente não foi reciproco, mas consegui fingir por alguns segundos, mostrando meu mais caloroso sorriso amarelo.

- Boa noite, meu primo. Quanto tempo não lhe vejo.

- Pois é. – como era mesmo o nome dele? – Ultimamente andei muito ocupado com os estudos, trabalho, namorada. Acabo que não tenho tempo para visitar a família.

- Ainda bem que existem essas datas comemorativas para reunir a todos. Não acha?

- Santos aniversários. O que seria de mim sem eles?

         Ele riu, não sei porque. Me convidou para entrar. E eu entrei. Me mostrou o caminho para a sala onde todos estavam reunidos. E eu fui até lá. Estava agindo como um cachorrinho guiado pelo dono, com os rabos entre as pernas pelo ambiente hostil.

- GAAAAAAAABEEEEEEEE!

         Eu dei um pulo e deixei o presente cair. Olhei para ver quem era a louca que estava gritando alucinadamente - como se estivesse tendo um orgasmo - meu nome. Era a minha tia.

- Oi Gabe, seu fofo. Quanto tempo não lhe vejo. Nossa como você está magro. Como está a sua namorada? E o seu trabalho? O que anda fazendo? Anda se alimentando direito? E a sua mãe? Tem falado com ela? Nunca mais tive noticias dela. E seu pai? Ainda trabalha naquela empresa de calçados? Ele melhorou da bronquite? Já perguntei da sua namorada? Quando vai casar com ela? Já tá na hora da sua mãe ser vó, não acha? Olha...

         Minha boca ia se abrindo e fechando, tentando responder a metralhadora de perguntas que era a minha tia, mas ela não deixava um microssegundo disponível para que eu pudesse pelo menos falar um “cala a boca”. Então a deixei falar. Ela adora falar. Até que, de repente, ela se calou, deu um sorriso e me levou até o fulano-aniversariante. Não antes de me fazer passar vergonha, é claro.

- GENTE, OLHA QUEM CHEGOU. O GABE.

         O mundo parou. Quem estava comendo parou de mastigar. Quem estava conversando parou de falar. Quem estava dançando parou de dançar. Todos os olhos se viraram para a minha direção. Minha tia gritou tão alto que eu tive a sensação de que o mundo parou de rodopiar no universo só pra prestar atenção em mim.

- Que é isso tia, não precisa exagerar. – sussurrei no ouvido dela.

- DEIXA DE FRESCURA, GABE. OH LENILDE, LENILDA, LENILTON, LENILSIVAN, LENILSON, LENILTA, LENISILCLEIDE, LENILSILEIDA, LENISCLEIA, LENISILCLEITON, LENILSILÉIA, LENISVALDO, LENISVANDRO E LENISLUCE VENHAM CUMPRIMENTAR O PRIMO DE VOCÊS.

         Como ela conseguiu falar esses nomes corretamente e tão rápido?

         Os minutos que se passaram foram cumprimentando todas as mãos e braços abertos que se dirigiam a mim, tanto dos fulanos, quanto de outros familiares e desconhecidos, que vieram devido ao escândalo que a titia fez com a minha chegada. Por ultimo veio o fulano-aniversariante.

- Meus parabéns primo. Trouxe esse presente pra você.

- Obrigado. Posso te fazer uma pergunta?

- Claro.

- Você é viado?

- Como é que é?

- Você é gay? Por que meu irmão Lenisvandro disse que você era um baitola.

         Quem era o Lenisvandro?

- Não, não. Sou heterossexual. Tenho até namorada.

- O pai de um amigo da escola se separou da mãe dele pra se casar com o vizinho.

- Puta que... – suspirei – Pode confiar em mim. Sou homem de verdade.

- Mas você tem jeito de viado. Tem certeza que não é?

- Tenho. Não sou viado. – disse, querendo dar uns tapas na cara desse moleque.

- Tudo bem então.

         Ele saiu correndo, olhando para um grupo de amiguinhos, gritando.

- RELAXA PESSOAL, ELE NÃO É VIADO.

         Criança é um amor, não é?

***

- Oi, gato. – me disse uma das primas-malucas-que-não-lembro-o-nome.

         Ela era linda, não podia negar. Mas nunca teve a sua consciência no lugar certo. Por varias vezes, na adolescência, pensei em me aproveitar da tara dela por mim, mas acabava desistindo por medo do que ela poderia fazer, ou ter.

- Oi, tudo bem?

- Não muito.

- Qual o problema.

- Tô precisando de um cachorrão, como você, pra tirar o meu atraso.

- Não curto ficar com primas. – menti.

- Ah Gabe! Deixa de frescura.

- Quais as novidades?

- Fui demitida.

- Por quê?

- Me pegaram transando com o contador. – ela hesitou. – Em cima da maquina de xerox.

         Ela nunca foi econômica com as palavras. Muito menos crivava os pensamentos.

- Não precisava entrar em detalhes.

- A xerox da minha bunda rodou toda a empresa.

- Detalhes, prima, detalhes desnecessários.

- Tenho uma xerox da minha bunda no meu quarto, quer ver?

- Olha...

- Se quiser pode ver ao vivo. Mais interessante, não acha?

- Acredito que a sua bunda seja igual às outras tantas por ai.

- Que grosseiro.

- E você é uma tarada.

- Só quando estou perto de você.

- Olha, tenho namorada. Sou fiel. Então me desculpe, não iremos fazer sexo hoje.

- Aquela vagabunda deve meter chifre em você direto.

- Você não a conhece.

- Mas sei que é uma vagabunda.

- Acha que seria idiota de estar namorando uma vagabunda.

- Se não me comeu até hoje, é porque é idiota.

- Nem camisinha eu tenho aqui. Então esqueça.

         Alguma coisa deveria fazê-la desistir e deixar meu pé em paz.

- Odeio camisinhas.

- Deus me livre. Não quero pegar gonorreia.

- Não tenho gonorreia. E mesmo que tivesse qual o problema? Todo mundo pega gonorreia um dia.

- Não eu.

- Deixa até mais gostoso.

- Ham?!

- É, o gosto e o cheiro deixa mais excitante.

- Puta que...

- VAMOS CANTAR OS PARABÊNS? – gritou a minha tia, salvando-me dessa tarada.

***

         Tá ai uma das coisas boas dessas reuniões de minha família, a comida. E graças à boa vida da titia acabamos sendo presenteados com uma mesa farta. Após me aproveitar de cada prato, divinamente bem preparado, resolvi sentar em uma das poltronas para aproveitar esse rápido momento em que alguns estão comendo e outros descansado, para poder ficar um pouco só.

         Observei que o meu primo-aniversariante-fulano estava perto dos seus amigos, olhavam para mim e davam risinhos tímidos. Olhei mais um pouco no salão e vi a minha prima-tarada-fulana olhando para mim, acariciando as coxas. Depois ela aproximou uma mão da outra, encostou as pontas dos indicadores e dedões e fez o formato de uma xana, fazendo movimentos com a língua imitando eu chupando aquilo.

         Eu mereço.

         Meu celular enfim vibrou no bolso. Finalmente um sinal de vida além das paredes daquele manicômio. Alguém lá fora se lembrou de mim e poderia, pelo menos por celular, me livrar das alucinações que aquele ambiente hostil estava me proporcionando.

         Era a Cris, minha doce e romântica namorada. Acabava de me mandar um sms.

- Oi, cachorrão gostoso. Au au

- Au au

- Quero te dar.

- Tô no massacre da serra elétrica, amor. :\

- Esqueci que ia pra esse aniversario. :(

- Tá um inferno. :*(

- A senhorita condiloma já tentou te estuprar?

- Sim, mas a missão dela foi infeliz.

- Quando a gente se ver irei querer avaliar o seu instrumento. Se tiver algo diferente eu lhe capo.

- Tudo bem. :D

- Ainda dá pra nos vermos hoje, amor. O soldado Ryan quer ser resgatado?

- Acho que os nazistas venceram essa batalha.

- Que pena.

- Mas amanhã irei precisar do seu carinho.

- Já irei separar o meu chicote.

- Cachorrona.

- Au au

- Te amo.

- Também te amo.

- Já tô indo dormir então.

- Tudo bem, amor. Beijos nos lábios. :-*

- Nos lábios? Você está até comportado.

- Nos grandes lábios. :-D

- Aaah, agora sim é o cachorrão que conheço.

- rsrsrsrsrsrs

- Au au. Beijos meu homem da glande grande.

- Tá assistindo muito vídeo na internet. Rsrs

- É... mas não deixa de ser verdade.

- Beijos amor.

- Beijinhos. E sobreviva, por favor.

- Pode deixar. :)

***

         Vendo a minha tia vir na minha direção fez eu pensar se conseguiria cumprir a promessa a Cris de que iria sobreviver.

- GAAAAAABEEEEE!

         Precisava gritar de novo?

- Oi, tia.

- Gostou do aniversario?

- Adorei tudo. – menti. – pena que já está acabando a festa.

- É uma pena mesmo. Espero que venha nos visitar mais vezes.

- Irei sim. – sorrir amarelamente. - Irei sim.

- Deixa eu te perguntar? – e adianta eu permitir ou não? – Isso é uma flor de Lis? – perguntou apontando para o meu cinto.

- É sim, tia. Gostou? Fui escoteiro, lembra?

- Isso é coisa de satanás.

- Como é?

- O pastor disse que a flor de Lis é coisa do diabo·.

- Cruzes, tia. A senhora acreditou?

- É verdade, sobrinho. Pesquisa na internet. Isso vai fazer tu ir pro inferno e ser estuprado pelo capeta.

         Não adiantava argumentar.

- Tudo bem, tia. Irei me livrar de tudo que tiver a flor de Lis em casa.

- Acho bom mesmo. – disse me dando leves tapas na bochecha. – agora deixa eu ir que seu tio irá fazer o discurso final.

         Acho engraçado a crença de alguns protestantes, como a titia. Para eles tudo vem do capeta. Fico imaginando a minha tia, uma senhora que botou tantos filhos no mundo, transando.

- Ai... ai... ai... Meu Deus.... ai... que gostoso... ai... ai.... vai.... vai gostoso... ai... isso é coisa do capeta... ai... satanás... ai... é tão bom... ai... ai... sai demônio... ai... ai... isso só pode ser coisa do pé preto... ui... mais fundo... é coisa do capeta... É COISA DO CAPETA.

         Enquanto fico pensando essas, como diria a vovó, saliências, meu tio está discursando no microfone. Percebo então que o fim da festa está próximo. Enfim sobrevivi. Poderei ir aliviado para os braços do meu amor, dizer com todas as forças que sobrevivi graças a ela.

         Fiquei aliviado, afinal todo aquele tormento iria acabar. Enfim, iria acabar. Não precisaria mais conversar com a minha tia, não iria ver mais os olhos desconfiados do meu primo, e nem enfrentar a minha prima tarada. Enfim, tudo aquilo iria acabar e eu teria paz na minha vida para sempre.

         Feliz por tudo isso, resolvi deixar meus pensamentos de lado e ver o discurso do meu tio, Consegui escutar somente a frase final.

-... e ainda temos outros treze filhos para fazerem aniversário. E o próximo é daqui a duas semanas. Todos aqui já estão convidados.

         Puta que pariu!

Xulapeta e Peidrolina


Xulapeta era uma plus size ativista. Uma das maiores lutadoras pela liberdade do corpo feminino, encarcerados em um padrão de beleza desumano e sem sentido. Desde que começou a ler livros de autoajuda e fazer terapia com uma psicóloga, ela deixou de lado a bulimia e abraçou, com agrado, os sabores prazerosos das comidas carregadas de gordura saturada, sal e carboidratos.

 

Invadiu vários desfiles por ai, gritando a todos a crueldade que aqueles tipos de eventos faziam com a humanidade. Fazia palestras em escolas dizendo às adolescentes que não existe padrão de beleza, que são lindas como são. Rapidamente ela virou referencia na luta contra o mercado da moda.

 

Certo dia Xulapeta entrou em uma lanchonete, aproveitou que as cadeiras de plástico não tinham apoio e juntou duas (uma para cada lado da bunda) e sentou. Pediu os lanches de A a Z e ficou aguardando. Estava escrevendo um texto no celular falando que as mulheres deveriam comer o que lhes fazem feliz, pois a felicidade é o sentido dessa vida e as pessoas devem lhes amar como são.

 

Ao longe ela viu entrando uma mulher super magra. Não a conhecia, mas seu nome era Peidrolina, secretária de um empresário famoso do ramo dos cosméticos. Ela sentou em uma mesa, com uma amiga, e pediu um x-tudo duplo king sive com fritas extras. Seu pedido chegou e ela começou a devorar, como se não houvesse amanhã.

 

Xulapeta olhou pra baixo e viu seus peitos caindo sobre mesa, ocupando metade dela. Olhou para a moça, magra e toda trabalhada na produção, comendo como uma condenada a cadeira elétrica. E refletiu sobre toda a sua vida.

 

Peidrolina estava quase acabando, quando uma grande escuridão abateu sua mesa e, antes que sua amiga falasse alguma coisa, foi golpeada com uma mesa de alumínio na cabeça, tão forte que sofreu um grave traumatismo craniano e morreu ali mesmo.

 

Xulapeta foi presa, mas com a certeza de que sua ideologia não seria superada por uma sequela com distúrbios hormonais belíssima que come tudo e não engorda.

 

Afinal, obesidade é ser feliz.

O menino que não usava cueca.

- Não uso cueca.
- Não usa porque não quer.
- Aperta o saco. Como andar por ai com o saco apertado?
- Compre uma cueca mais frouxa.
- Ai vai ficar entrando no cu. Como andar por ai com a cueca no cu?
- Compre daquelas cuecas box.
- E o calor nortista? Vai esquentar tudo. Como andar por ai com o colhão quente, suando, coçando?
- Compre cuecas de tecido leve.
- Mas é um grande problema pra mijar. A gente têm que abrir o zíper, enfiar a mão lá dentro, abaixar a cueca, e urinar com ela fazendo força pra cima. Você não consegue balançar direito, e acaba molhando a cueca.
- Limpa com o papel higiênico, oras.
- Não vou usar cueca. Só é problema.
- Você que sabe. Nunca vi isso. Homem que é homem usa cueca.
 
No dia seguinte
 
- Bom dia, Juca.
- Bom dia, Pedro.
- Sabe, Juca. Parei de usar cueca também.
- Por que mudou de ideia, Pedro?
- Ontem eu fiquei com Antoninha.
- Ela é casada, Pedro.
- Eu sei. A gente se agarrou atrás da casa dela. Abrir o zíper, abaixei a cueca, mas ela fica forçando pra cima, apertando as bolas. Resolvi tirar a calça e a cueca. Tonhão apareceu, quase nos pega, sai correndo nu, pulando o quintal dos outros.
- Se não tivesse de cueca, era só abrir o zíper. Sem problemas.
- Foi o que percebi.
- Viu como não usar cueca só tem vantagens?
- Os homens precisam saber disso.
- Vamos viajar fazendo palestras de “Porque não usar cueca”.
- Vamos.
 
Hoje em dia Pedro e Juca são palestrantes milionários, reconhecidos internacionalmente, libertando os homens do cárcere das cuecas, e deixando em falência varias grifes. Seus livros vendem aos milhares e podem ser encontrados em quase todos os países.

Nem Tudo é o Que Parece


Fuu fuu fu fu fuuuuu (Whatsapp chamando)
 
- Vem aqui em casa, pra gente trepar horrores.
- Por acaso cresceu alguma árvore no seu quintal que não tô sabendo?
- Você entendeu.
- Depois que a gente começou a ficar você ficou desbocada.
- Não fiquei desbocada, só ficamos mais íntimos. Eu sou assim.
- Você sabe que sou um homem recatado e do lar.
- Quanta frescura! Vem logo me comer.
- A gente fez amor ontem, e já tá com vontade hoje?!
- Não foi amor, foi sexo. Demos uma foda genial.
- Essa palavra é horrível.
- Você é todo fresco, mas fode bem.
- Obrigado, eu acho.
- Vem ou não?
- Tô cansado de ontem.
- Affffff
- Sabe, Lu, estou procurando um relacionamento serio.
- Pra que?
- Pra me estabilizar. Curtir só uma pessoa, namorar, casar, ter filhos.
- Que pensamento retrogrado.
- Você não pensa nisso?
- Quero é fugir de casamento.
- Você ficaria linda com vestido de noiva.
- Ziuuuuuu
- É sério, Lu.
- Marcos, esse palpo tá chato. Não quer fuder, têm quem queira. Fui.
- Abraços, Lu.
 
Fuu fuu fu fu fuuuuu (Whatsapp chamando)
 
- Oi, Marcos.
- Oi, Sandra.
- Tudo certo pra hoje?
- Com certeza.
- Vai nos levar onde?
- Naquele motel novo que inaugurou semana passada. Antoninha e Carla aceitaram o convite?
- Com certeza. Elas já até estão aqui, todas molhadinhas por você.
- Pelo visto vocês vão me destruir.
- E mais.
- Chego ai daqui a pouco.
- Certo.
 
Fuu fuu fu fu fuuuuu (Whatsapp chamando)
 
- Marcos.
- Fala, Lu.
- Serio que a gente não vai fuder hoje?
- Estou quebrado, Lu.
- Cara chato!
- Tenho que sair agora.
- Vai onde?
- Pra igreja.
- Fala serio.
- Vou rezar por você, não se preocupe.
-...
- Abraços.
- Vai te fuder, vai.

Vestes para se despir

Ela se vestiu para se despir.
Uma dança sensual e romântica,
Com profundezas de um louco tesão,
Como gotas de poesia profana.
 
Minha boca foi inteira ao chão
E meu membro foi erguido ao céu.
Cada peça de roupa era um réu
Condenado a ficar longe da cama.
 
Éramos carnes, corpos nus,
Que se amavam enlouquecidamente,
Arguido com pensamentos constantes
De uma luxúria infernal e latente.

Disco de Chocolate


Aproximei-me do rio Parauau como se nada quisesse, mas era totalmente o contrario. Queria seu sossego, sua paz, sua beleza. Queria estar ali só por estar, e aproveitar cada minuto da sabedoria daquele milenar rio de águas barrentas. Atrás de mim homens trabalhando para levantar o parque para a festividade que se aproxima, e em minhas mãos um M&M’s para saborear enquanto permanecia ali, em silencio. Perto de acabar o saquinho, um dos pequenos discos de chocolate cai da minha mão, deixando-me frustrado. Mas olho com atenção aquele doce no chão, e percebo que ele caiu bem em cima do caminho de umas formigas. A frustração se foi, e sorri. Era Deus atendendo as preces daquelas pequenas criaturas. Liguei a minha moto e sai dali, feliz por mais uma lição aprendida.

A Queda


Foi-se para um abismo sem fim, gritando em agonia, mas sua voz não saia, somente o som do nada. Um vácuo sem fim, que tragava sua sanidade. Caia, caia e caia. Via as labaredas, rochas e caveiras passarem ao seu redor como relâmpagos. Ora ou outra via outros caindo, também gritando suas dores abafadas com um silêncio enlouquecedor. Mas eram agarrados por correntes, que saiam das pedras, levando-os para as muralhas para o fim eterno desconhecido. Ele caia, sentindo o bafo putrefato do que existia no fim do abismo. Sua pele chamuscava, derretia, queimava sem fim. Suas tripas eram arrancadas, e retornavam por magica. Até quando ele cairia, não sabia. Mas, naquele eterno instante, percebeu que quanto mais se sobe, durante a vida, de forma cruel e egoísta, mais sua queda para o inferno será grande.

A Mortalha do Poeta


Todo escritor é costureiro,
Tecendo mortalhas para corações
Mortiços de amor e de razões
Quase parecendo um coveiro.
 
Engana-se que o poeta é só amor.
Amar é sentir dor.
Sendo esmagado o tempo inteiro
Por forças confusas e sem sabor.
 
Longe de mim desenganar-te
Afunde-se na crença que quiseres.
Mas lembre-se que nem sempre o coração
Tem razão naquilo que te queres.

Divagando Sobre Amores e Amigos


Sabe, a amizade é o solo que nutre a flor do amor entre um homem e uma mulher. E as pétalas dessa flor são o que mantêm este solo nutrido. Um precede o outro, e inexiste sem a presença de um deles. Um solo mal nutrido produz uma flor doente, e uma flor doente não renova as nutrientes do solo. Gostamos de separar as coisas, dividi-las, mantê-las aprisionadas em conceitos as quais acreditamos compreender. Amor é amor. Amizade é amizade. São coisas distintas, separadas entre si. Nossa, que grande equivoco cometemos com nós mesmos. Seria tão mais fácil viver e amar se aceitássemos que tudo está, igualmente, separado e interligado. Veja a sabia natureza, vivendo neste mundinho há bilhões de anos antes de pensarmos em virar bípedes. Sua perfeição está justamente nessa separação e interligação de tudo. Um vive separado do outro, mas sua existência está intrinsicamente ligada na existência do outro. E nós, humanos, estamos longe de estarmos fora dessa conexão. Que loucura, não é? Começamos a falar sobre a conexão entre amor e amizade entre um homem e mulher, e acabamos divagando sobre a existência. Mas, ambos, amor e existência, não possuem o mesmo conceito para funcionar? Amo porque há alguém para eu amar, existo porque há alguém para sentir minha existência. Sentiram a conexão e importância de permitirmos amar e deixar o outro se aproximar? E pensar que toda essa conversa surgiu por eu pensar nas mulheres que eu me apaixonei e que, seja lá por qual defeito ou qualidade existente em mim, olharam para mim e só viram um amigo. E se elas enxergassem a vida como eu, será que aquele sentimento nascido em mim fosse correspondido e estaríamos, até hoje, nos amando como amantes e amigos? Questões sem resposta, como quase todas as grandes questões da vida. E a vida, como sempre, vai seguindo seu rumo tentando nos ensinar o obvio, que ousamos negar em ver.

Amor Proibido

É um amor proibido,
Que se realiza na penumbra.
É no oculto que a verdade
Se faz e refaz.
Longe dos olhos alheios,
Próximo dos olhos da amada.
Dois corpos proibidos
Que se entrelaçam em paixão.
É longe do mundo
Que achamos nosso mundo.
Em todo lugar permitido,
É somente no negado
Que queremos estar.
Não importa os perigos
Que o futuro guarda.
O importante é o amor
Que o presente nos farta.

A Poesia na Dança


O que seria a dança para um homem
Que usa as palavras para se expressar?
Nada mais é do que a mais pura poesia
Expressada na arte de se movimentar.

 A dança é verso carregado de calor,
Com toques sensuais, salpicados de luxuria.
São cartas corporais de convite para o amor.
Rimas implícitas de libido e ternura.

 A dança é crônica da história desse mundo,
Encenada com o corpo, sentida com a alma.
Onde cada movimento nos toca lá no fundo
Nos regando de um encanto que sempre nos acalma.

 A dança é conto, romance e fantasia.
Mais do que arte, é forma de se expressar.
Seja para comemorar, fugir ou namorar,
Seja para os lamentos de um povo demonstrar.

 Como descrever em palavras o dançar,
Arte sublime, presente de Deus?
Como poeta somente me permito sentir
As rimas presentes nos movimentos teus.

Amor Oculto

Adoro essa mulher
Que não me conhece.
Se ela soubesse
O quanto é amada
E desejada
Talvez se apaixonasse,
Ou se assustasse.
Quem sabe os medos,
Preconceitos,
E traumas,
Que aqueles
Lindos olhos castanhos
Escondem.

Maria do Boi


Estava longe de casa, me sentindo em casa. Mas não na vida que tenho hoje, mas a casa de uma vida que já se foi. Sensações que remetem a lembranças, que rementem a saudade. Um tanto saudosista andei um pouco por aquela rua, simples e esquecida, pulsando vida.

 

Pessoas simples, terra de chão batido, vegetação natural, crianças de pés descalços brincando. Me vi novamente na minha infância, enquanto corria pela Justo Chermont procurando ser criança. Sem mascaras, preocupações e anseios. Somente o desejo de ter mais um dia alegre e feliz.

 

Apesar da insegurança que aquelas pessoas sofrem diariamente, aquela rua pulsa vitalidade, amor, carinho, solidariedade. É um reencontro de uma humanidade que vem se perdendo aos poucos nas áreas nobres de qualquer cidade que encontramos. Queria despir-me da minha carne adulta e tirar novamente aquela criança que vive dentro de mim, para se juntar com um grupo de crianças que corriam livres, ou me unir a outro grupo que havia capturado um camaleão e estavam fascinados com a façanha e com o animal.

 

Vejo, ao longe, um pai carregando o filho no ombro. Ele, feliz. Feliz por estar no alto, vendo tudo e todos de um ângulo diferente. Feliz por, mesmo sem sandálias e uma roupa da moda, estava junto com o seu pai. Vi o sorriso daquele genitor. Mesmo vindo cansado do trabalho, muito provavelmente um trabalho manual pesado, ainda tinha animo e forças para dar aquele tempo para seu filho.

 

Estava longe, mas perto de um eu que há muito tempo havia esquecido. Um lugar distante dos olhos da sociedade, que diariamente nos ensina a vermos com mais clareza e amor para aqueles que estão do nosso lado. E quem, hoje em dia, se dispõe a ver a dor do seu vizinho?

 

Maria do Boi, nome tanto falado por ai por causa da criminalidade, mas ninguém vê o seu berço de sabedoria e ensinamentos tão necessários para essa sociedade doente em que vivemos. Espero que você viva, e sobreviva, para ensinar a mais gerações quais os verdadeiros sentidos da vida.

Testemunha da Insônia


Talvez eu tenha
Que mudar o teto.
Pintá-lo, adorná-lo.
Fazer algo que o deixe
Bem mais atrativo.
Afinal, ele é meu único
Companheiro nas noites
De profunda insônia.
Minha única testemunha
Das noites que passo
Acordado,

pnsando em ti.

Inferno no Inverno

Sobrevivi ao inverno do seu coração
Quase falecido.
Sabia que seria dessa forma,
Mas resolvi arriscar.
Acreditei que a primavera
Do meu amor
Pudesse aquecer
Suas geleiras.
Infeliz engano.
Seu inverno transformou
Minha vida num inferno.
E quase me perdi,
Abandonado na solidão.

Uma Ida ao Churrasco


Havia mais pessoas ali do que estava acostumado, pedi meus espetinhos e sentei em um dos bancos enquanto aguardava serem assados. Me surpreendi quando um homem sentou na mesma mesa que eu estava, sem ao menos olhar para mim, pedir licença ou perguntar se aquele lugar estava ocupado. Simplesmente chegou e sentou, como se não houvesse alguém naquele lugar, ocupando-o. Olhei para ele por um tempo, e relembrei a minha infância quando minha mãe sempre me pedia para, quando fosse sentar ou pegar uma cadeira de algum lugar, perguntar para as pessoas que lá estão se aquele assento estava ocupado, e pedir permissão para tirá-lo. Um gesto simples, cortês, educado, uma atitude básica para um bom convívio social. Ao redor os grupos de conversa, jogando o papo fora sobre acontecimentos do passado que em nada mudarão o futuro dos ouvintes. A moça chegou com minha sacola com os espetinhos, peguei e me levantei. Nem tive tempo de virar as costas, e o sujeito que me fazia “companhia” se levantou e sentou no lugar que, microssegundos antes, estava sendo ocupado por mim. “Se eu não tivesse saído dali logo...” pensei. Sentei na minha moto, a liguei, e dei uma ultima olhada para todos aqueles seres humanos que estavam naquele local, principalmente para o indigente que se sentou comigo e, com aquela cena, tive a reafirmação de algo que há anos venho acreditando: com o que temos, não vamos muito longe.

Palavras soltas

Poesias em papeis,
Espalhados pelo chão.
Cada canto um verso,
Um sentimento,
Um desejo.
Cada rabisco um fosso
De amores, traumas, sabores.
Um quarto bagunçado,
Uma alma perturbada.
Um escritor solitário,
Um coração destruído,
Um homem perdido.

Contratos quebrados.

Absorto, ele fixava sua visão no teto enquanto sentia os delicados dedos dela tateando seu tórax, deleitando-se com os resquícios de prazer ...